engulo aquilo que disse anos a fio

Cresci a ouvir uma “discussão” protagonizada pelos meus pais. Na hora de arrumar as coisas, a minha mãe optava por mandar muita coisa fora. Doava aquilo que estava em condições e o resto tinha como destino o lixo. Porém, o meu pai tinha sempre uma solução para algo. “Não se vai mandar isso fora porque pode servir para isto ou aquilo”, dizia. Nestas alturas, juntava-me quase sempre à minha mãe. “Pai, isso é lixo. Manda fora”, eram as minhas palavras. Mas, nem assim o meu pai se demovia da sua intenção.

Isto arrastou-se durante anos e ainda hoje acontece. Com uma agravante. Agora, pareço o meu pai. Estou a fazer a minha primeira mudança a sério. A minha mulher já me abordou com vários objectos que segundo ela devem ir fora e eu digo que é melhor guardar, apesar de saber que provavelmente não servirá para nada. Resta-me engolir as palavras que sempre disse ao meu pai.

E a verdade é que agora dou mais valor ao meu pai nesse aspecto. Sobretudo quando olho para o passado e lamento não ter guardado um walkman, por exemplo. Há muitas coisas que marcam a minha infância/juventude (e que já não existem) que podia ter guardado e de que acabei por me desfazer. Acredito que o facto de querer guardar objectos agora é porque marcam um determinado momento da minha vida. E é isso que faz com que me custe tanto mandar algo fora. Apesar de saber que é um objecto sem qualquer utilidade existe uma história por detrás dele. E isso faz com que seja especial demais para acabar num contentor.