Nos últimos dias o jornalismo
português voltou a ser falado. Em duas situações distintas. Uma
delas aconteceu a Norte, mais concretamente no Estádio do Dragão. O
Porto tinha acabado de perder com o Estoril. Mais de uma centena de
adeptos, desiludidos com o resultado, aglomeraram-se na zona da
garagem por onde os jogadores deveriam abandonar o estádio. Mais de
uma hora depois do final do jogo, surgiu Jorge Nuno Pinto da Costa
nesse local para falar com os jornalistas.
Naquele momento, o jornalista da TVI
fez a pergunta mais adequada da noite. Questionou o
presidente sobre a continuidade de Paulo Fonseca no clube.
Completamente desesperado, Pinto da Costa ameaçou o jornalista,
obrigando-o mesmo a abandonar o local, algo que este acabou por fazer a “convite”
de uns quantos seguranças. Isto é lamentável. O jornalista fez a
questão mais pertinente da noite. Está no seu dever. E o presidente
do Porto está no seu direito em não responder. Mas, fica-se por aí.
Não tem de empurrar o jornalista nem de o convidar a abandonar o
local. Esta política do medo leva a que existam jornalistas que
apenas fazem as perguntas que alguém quer ouvir, com medo de represálias. E isso não é ser
jornalista.
Mais a Sul foi a vez de Manuel Luís
Goucha e Cristina Ferreira (cujo talento admiro), os apresentadores de A Tua Cara Não Me É
Estranha – Kids, falarem mal dos jornalistas, tendo por base uma
revista que publicou histórias sobre as famílias dos concorrentes.
Defendem que aquilo não se faz. Que os meninos, que andam todos na
escola, vão levar com os colegas que viram as revistas. Além disso,
deram a ideia de se criar uma revista onde se contam os “podres”
das famílias dos jornalistas e incentivaram ao boicote à compra de
algumas publicações.
Eu compreendo a opinião sobre os
conteúdos editoriais de algumas publicações. É normal que existam
muitas pessoas que não gostam de certos conteúdos que consideram
mais agressivos, despropositados ou mesmo um lixo editorial. Mas, se
existem esses conteúdos, é porque alguém os consome, certo? É o
mesmo que o lixo que passa na televisão. Se existem programas fracos
é porque alguém os vê. E, que eu saiba, ninguém compra revistas
com uma arma apontada à cabeça. Num quiosque, existem dezenas de
publicações, escolher a mais adequada é uma opção pessoal. Tal
como escolher um bom programa é uma opção pessoal.
Além disso, nos dias que correm,
duvido que exista alguém que pense que vai entrar num programa de
grande audiência sem que a sua vida seja vasculhada. É o preço a
pagar por que quer alcançar fama através de um programa de
televisão. Se isso é justo ou não depende da visão de cada um. Mas é a "lei do jogo". É algo que acontece desde a primeira edição de Big
Brother. E que irá continuar a acontecer. Se existem revistas de
televisão, é normal que abordem tudo aquilo que envolve um programa com audiências e que, segundo os números de vendas, as pessoas gostam de ler.
Ainda neste programa, acho que se
ignora a grande questão. Os apresentadores questionaram as
publicações que vão atrás das crianças que andam na escola de
segunda a sexta. Volto a dizer que não questiono isto e não condeno
quem acho que seja lamentável. Mas não será também grave ter
crianças de onze anos, as tais que na segunda de manhã estão cedo na
escola, a cantar num programa de televisão à uma da manhã? Ou esta
“exploração”, a troco de cinco minutos de fama e dinheiro não
interessa para nada? Se as crianças são assim tão importantes para
o canal, porque não fazer o programa à tarde ou a acabar muito mais
cedo, já que no dia seguinte têm de estar cedo na escola? Não será que o interesse das audiências também é lamentável para a vida de crianças de pouco mais de dez anos?
A dupla de apresentadores salientou que
existem pessoas muito más na Imprensa em Portugal. Isso é um facto.
Quer seja nas publicações que referiram ou em qualquer uma das
outras que ficaram por dizer.Não escapa uma. Mesmo daquelas mais "sérias" que nunca são mencionadas nestes
casos. Tal como existem pessoas muito más na televisão. Sem talento
e sem qualidade. Quer seja na TVI ou em qualquer um dos outros
canais.
Quando ouço estes comentários sobre a
imprensa nacional, que é má, fico sempre a pensar naquilo que
consideram um jornalista bom. É aquele que só escreve que o famoso
x tem um carro novo oferecido pela marca y? É aquele que escreve que
o famoso x tem um novo contrato publicitário que lhe vai valer y? É
aquele que é convidado para cobrir o evento x porque a marca y assim
o exige para que o famoso z continue a ter coisas à borla? É isto
que é ser um bom jornalista? É que, para isto não são precisos
jornalistas.
Porque será que o jornalista que
denuncia que o famoso x deve dinheiro a x é mau jornalista? Porque
será que o jornalista que denuncia que o famoso x não paga pensão
de alimentos é mau jornalista? Porque será que o jornalista que
denuncia que o famoso x engana pessoas é mau jornalista? Porque é
inconveniente?
Os jornalistas têm o dever de informar
as pessoas. Existe um código deontológico que é igual para todos
os jornalistas. E, seja para uma notícia positiva ou para uma
notícia negativa para alguém, ele deve ser seguido à risca. Para
que a notícia tenha fundamento e seja verdadeira. Porque será que
ninguém questiona uma notícia sobre um político, onde se diz que é
o maior trafulha do mundo, mesmo que seja falsa, mas uma grande
maioria das pessoas questiona tudo o que é notícia sobre um famoso
qualquer? Isso é algo que não compreendo.
Depois, existe ainda a vertente da vida
pessoal. E a verdade, que algumas pessoas tendem a ignorar, é que
uma pessoa famosa (político, apresentador e por aí fora) têm menos
direitos do que um cidadão anónimo. É assim que são as coisas.
Aqui e em qualquer parte do mundo. O que faz algum sentido porque são
pessoas que tem uma imagem pública da qual vivem. Como tal, é
normal – pelo menos para mim – que tenham menos defesas legais do
que eu. Eu não sou famoso. Não vivo da minha imagem. Como tal,
posso accionar certos meios legais que eles não podem. É um dos preços da fama e do
estrelato. Agora, o que muitas pessoas conhecidas pensam é que abrem
as portas da vida pessoal apenas quando dá jeito. E isso não é
assim. É uma porta que, uma vez aberta, não se volta a fechar.
Abrir ou fechar essa porta é uma opção de cada pessoa conhecida.
Há quem tenha uma longa carreira (e sempre em alta) sem nunca
promover a sua vida pessoal. E há quem o faça porque não se
consegue promover de outra forma. É a mais pura das verdades.
E quem acha que a Imprensa portuguesa é
má ou agressiva, é porque não conhece a espanhola, a britânica ou
mesmo a americana, que não poupam ninguém! Porque, quem conhece as publicações desses
países e aquilo que eles fazem, facilmente percebe que em Portugal
os jornalistas são uns anjinhos. Aliás, existem muitas figuras que
podem agradecer aos jornalistas as vidas de fachada que levam. Vidas
essas que são do conhecimento de todas as pessoas mas que os
jornalistas, os tais que não prestam, optam por não publicar para
não destruir uma vida ou carreira nem arranjar problemas graves a
essas pessoas.
Como isto já vai muito longo,
acrescento apenas que é verdade que existem jornalistas muito maus.
Que não seguem o código deontológico e que não olham a meios para
atingir o fim que é ter notícias e vender mais exemplares de uma
qualquer publicação. Mas também é verdade que existem mecânicos
muito maus. Que dizem que nos venderam uma peça nova e estão a
vender uma usada e em péssimas condições. Tal como existem
péssimos profissionais em todas as profissões. Há que saber diferenciar.