24.1.14

o que é feito dos porquês?

Quando somos mais novos (e mais genuínos) fazemos uma pergunta. Sobre um tema qualquer. Em troca recebemos uma explicação. Não satisfeitos, perguntamos novamente porquê. É-nos dada uma explicação diferente. Voltamos a mostrar a nossa insatisfação e lançamos um novo porquê? A pessoa dá-nos a terceira explicação, completamente diferente das anteriores. Mas a nossa insatisfação não fica saciada. Queremos mais. Desejamos que nos expliquem tudo até ao mais ínfimo detalhe. E continuamos a disparar porquês atrás de porquês até desgastar a pessoa que faz os possíveis e impossíveis para matar a nossa sede de conhecimento, típica da tenra idade. É certo que não passamos de crianças. Mas não aceitamos nada menos do que uma explicação perfeita que nos dê a conhecer tudo aquilo que queremos, de modo a criar uma imagem bem elaborada sobre algo.

Os anos vão passando. Com eles estes porquês vão diminuindo. Até que desaparecem por completo. Até ao momento em que um(a) colega nos diz que a fulana x é uma cabra por isto e por aquilo. E nós acreditamos. Aceitamos aquelas palavras, muitas vezes infundadas e lançadas com o objectivo de criar o caos, sem um único porquê. Até que nos mandam um email a falar mal da pessoa y. E nós acreditamos. Se alguém escreveu, é porque é verdade. E dispensamos os porquês que nos permitem separar um boato motivado por inveja ou outros interesses nefastos da realidade. Aceitamos tudo de mão beijada. Não colocamos nada em causa. Nada! As merdas que nos poluem são todas assumidas como verdades inquestionáveis. E ai daquele que ouse duvidar de algo. É logo atacado por uma alcateia sedenta de sangue: “És parvo? Estás a duvidar porquê?”, dizem a maior raiva que conseguirem.

E com a morte destes porquês facilmente se matam muitas outras coisas. Em poucos segundos instala-se o mau ambiente num qualquer local de trabalho. Em breves segundos existe uma pessoa que passa a ser olhada de lado, quem sabe porque se lançou um boato (que não passa disso mesmo) de que subiu na carreira na horizontal ou porque supostamente andou a falar mal dos colegas, quando na realidade quem lançou os boatos (passando por estrela da companhia) é que é uma pessoa intragável que se deve evitar. Sem porquês e com muita poluição sonora temperada com veneno facilmente se destrói a mais sólida das amizades. Ou coloca-se mesmo um ponto final numa relação amorosa. E contra mim falo pois no secundário terminei um namoro com base em boatos, que não passaram disso mesmo, lançados por alguém que gostava da minha namorada.

Para mim, esse foi o ponto de viragem. A partir daí acabou-se o emprenhar pelos ouvidos. Voltei a ser a criança que precisa das dezenas de porquês, dizendo com frequência: “explica-me isso como se eu tivesse cinco anos.” Faço os possíveis para acreditar nas pessoas mas tenho tendência para duvidar de tudo aquilo que me dizem. Sobretudo daquelas conversas que nascem fruto do veneno de alguém e que são motivadas pelo caos que esse mesmo alguém pretende criar. 

18 comentários:

  1. Acho que quando os "porquês" são poucos, o interesse também o é...

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    1. Aceito isso. Mas é pena que muitas pessoas acreditem em mentiras julgando que é uma verdade absoluta.

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  2. Eu tenho um não acabar de porquês! :) Mas gosto de os descobrir/responder por mim mesma. E sou o tipo de pessoa que dificilmente acredita em algo que me contem como sendo verdade sem ouvir o outro lado da história. Já fui alvo de boatos, e sentir-me sem direito a ter voz é muito humilhante. Quantas vezes eu cruzo informações e não batem certo! Se me acontece a mim acontece aos outros também. Daí, que recuso boatos. Há sempre o outro lado, e não estamos na pele dos outros para tecer julgamentos.

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    1. Ainda bem que és assim :) Costuma dizer-se que nas costas dos outros vemos as nossas. E é bem verdade.

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  3. Sou totalmente a favor dos porquês e de exigir explicações "como se eu fosse muito burrinho". Se há coisa com que não lido bem é com coisas pouco claras e pragmáticas, especialmente porque, de certa forma, sou mesmo muito burrinho para certo tipo de coisas.
    No entanto, o desaparecimento dos porquê não é necessariamente uma coisa má. Quando vamos crescendo os porquês diminuem mas aumenta a nossa inteligência e o nosso poder de decisão, especialmente no que toca a confiar nas outras pessoas. Se aceitamos sem questionar, pode não ser por termos perdido aquele interesse infantil, mas sim porque crescemos e aprendemos a confiar. O problema é que cada um confia à sua maneira e o que funciona para uns, pode não funcionar para outros. Acho que os porquês têm que se transformar em benefícios de dúvida.

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    1. Podem transformar-se em benefícios da dúvida. O importante é que exista algo que nos impeça de acreditar em tudo.

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  4. grande verdade. só é pena não haver mais gente assim!

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    1. Acho que todos devemos questionar aquilo que nos chega. Felizmente, aprendi isso como jornalista e transporto isso para a minha vida.

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  5. Não podia concordar mais, as pessoas emprenham mesmo pelos ouvidos e com consequências trágicas por vezes.
    Há duas máximas que costumo usar no dia-a-dia: não considerar ninguém boa ou má pessoa, até me provarem o contrário são pessoas, às vezes as pessoas que parecem mais inofensivas e mais prestáveis são umas falsas e sangue-sugas que só querem alguma coisa de nós; a segunda é não acreditar em tudo o que ouço, especialmente se me vierem falar mais de alguém pois tenho tendência a perguntar o que dirá essa pessoa de mim nas minhas costas.
    Infelizmente, este mundo está cheio de pessoas más e mesquinhas, uma das minhas resoluções para 2014 é passar o tempo livre com pessoas que realmente interessem. A vida é demasiado curta para ser gasta com pessoas que não acrescentam nada. Felizmente ainda existem aquelas com quem é sempre um prazer privar.
    Parabéns pelo blogue.
    AB

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    1. É uma das doenças deste século. Infelizmente.

      Boa atitude e uma boa resolução.

      Parabéns e obrigado pelas simpáticas palavras.

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  6. e bom nunca se deixar de ser crianca e de questionar: e pq em vez de se aceitar tudo como se de um dogma se tratasse. sempre que posso eu pergunto: e porque? :)

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  7. A verdade é que quanto mais crescemos, mais comodistas ficamos...
    Se ha coisa que eu gostava de ter era a inocencia que tinha quando era criança, que foi perdida inconscientemente , sem dar por ela! Porque as pessoas olham para as coisas e nao se questionam, se é preto é porque é preto e se é branco é porque é branco. Com o crescimento as pessoas deviam questionar mais e nao limitarem-se ao mito que sao as supostas verdades inquestionáveis.

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    1. E porque não recuperas essa inocência? Eu não deixo que a minha morra.

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  8. Eu diria que existem pessoas que emprenham pelos ouvidos (peço desculpa pela expressão menos agradável) e outras jamais o fariam. Por mim falo, nunca, e sublinho nunca, acreditei em algo que pusesse em causa a minha amizade por alguém. Ou seja, oiço, e entretanto sento-me à frente do amigo/amiga e tenho uma conversa honesta e transparente, aí cruzo dados e chego à minha própria conclusão.

    Não é uma questão de "porquês" é uma questão de amizade. Não somos verdadeiros amigos de alguém, ou alguém não será nosso verdadeiro amigo se se acreditar na 'cusquice' que outro alguém resolve plantar, pode até ter um fundo de verdade, ou também pode não existir verdade alguma. Cabe-nos a decisão.

    Essa coisa de com a idade se deixar de questionar tudo, não é de todo verdade. Terá mais a ver com as pessoas de que com a idade. Vejo-me aos 70 anos ainda a chatear muita gente com trezentos mil porquês.

    Bom fim-de-semana :)

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    1. Há poucas pessoas como tu. A maioria começa a acreditar em tudo sem questionar nada. O que é pena.

      Uma boa semana!

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    2. Subscrevo inteiramente a resposta da Maria Madeira!

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