Ele é apenas um ano mais velho do que
ela. Os pais de ambos eram amigos. Viviam na mesma rua. Até era
frequente combinarem os mais diferentes planos em cada uma das casas.
Isto aproximou-os ainda mais. Era normal andarem sempre juntos. Ele
fazia parte das brincadeiras dela e das suas amigas. E ela era muitas
vezes protagonista das brincadeiras dele e dos seus amigos. O que ela
gostava de participar nos jogos de futebol de rua onde chegava a
destacar-se mais do que qualquer rapaz. Tal como ele tinha jeito para
brincar às casinhas. Apesar de preferir não o fazer.
Os anos iam passando. E eles sempre
juntos. As amizades iam mudando com o tempo mas a deles permanecia
igual. Como se fosse algo de nascença que ninguém conseguiria
alterar. Até que chegou a altura dela ir para a escola. A mesma onde
ele já andava. Nessa altura passavam o tempo livre sempre juntos.
Com o passar dos anos e baralhados com as conversas que ouviam dos
adultos, diziam-se namorados. Era habitual vê-lo desenhar um coração
no braço, com a caneta vermelha. Tentava copiar aqueles que via nos
braços dos homens sem perceber que tinham sido feitos durante uma
guerra. Já ela, gostava de desenhar na mão, com a caneta dele, o
símbolo do infinito. Algo que facilmente aprendeu em casa, por ser
igual ao número oito mas deitado. Desconheciam o que era amor. Mas
diziam sentir isso um pelo outro. Não sabiam o significado de
paixão. Mas juravam estar apaixonados um pelo outro. Não conseguiam
perspectivar um futuro a dez anos mas garantiam que estariam
eternamente juntos. Diziam que aquilo que sentiam era tão especial
que até chegavam a trocar alguns beijos que duravam centésimos de
segundo e que terminavam de forma tímida e envergonhada.
Os anos continuavam a passar. Ele ia
mudando. Não apenas fisicamente. Tal como acontecia com ela.
Sobretudo na altura em que mudavam de escola. Foi assim quando foram
para a escola preparatória. E isso notou-se ainda mais quando foram
para a escola secundária. Apesar das mudanças continuavam a
dizer-se namorados. Aliás, os amigos até já os viam como exemplo
de casal. Coisas de adolescentes, diziam ambos, um pouco mais
conscientes sobre aquilo que é o amor. Ocasionalmente, recordavam os
corações nos braços, os símbolos do infinito e até algumas
cartas de amor. O tempo continuava a passar. Até que ele foi para a
universidade. Para o curso de comunicação. Com a média um pouco
baixa, não teve outra opção. Teve de ir estudar à noite, para uma
privada, que pagava com o ordenado do emprego que tinha arranjado.
Um ano depois, foi a vez dela. Aluna exemplar, seguiu o mesmo curso
dele. Mas na universidade pública que sempre desejou.
E tudo mudou. O emprego dele, a
faculdade à noite e as novas rotinas trouxeram novas amizades. A
vida estudantil exemplar dela não lhe deu margem para grandes
aventuras longe dos livros. Costumava dizer que temia perder o fio à
meada. Com isto, a distância entre ambos cresceu. Sem parar. Ele até
chegou a tatuar o símbolo do infinito no pulso esquerdo. Tatuagem
que oculta com o relógio. Até ela a ver, ele nem sequer se lembrava
de que era o que ela costumava desenhar nos tempos em que se diziam
namorados. Ela já tem namorado. Que em nada se parece com ele. De
vez em quando cruzam-se no café. Ela e o seu namorado. E ele. Que de
vez em quando está acompanhado pela amiga com quem dorme
ocasionalmente naquilo que é o mais próximo que tem de uma relação
amorosa.
Não existem constrangimentos. De parte
a parte. Mas também nunca perderam tempo a falar sobre o passado.
Algo que até evitam partilhar com o namorado dela e com a amiga
dele. O que existe para recordar é feito pelos olhares de ambos, que
se cruzam o tempo suficiente para que alguns momentos sejam
recordados com saudade. Mas, de uma coisa estão certos. Nunca se
amaram. Nem tão pouco são os melhores amigos. Ele tem a certeza de
que ainda não sabe o que é amar. Já ela. Que encontrou o amor.
Sabe que nunca o viveu com ele.
Gostei muito!
ResponderEliminarMaria
Obrigado Maria :)
EliminarObrigada pela partilha. O amor está em Alta hoje, também eu coloquei uma história (real) marcante.
ResponderEliminarBoa semana!!!
http://saladosilenciocorderosa.blogspot.pt
Vou ver a tua história. Esta foi fantasiada :)
EliminarBoa semana.
:)
ResponderEliminarAinda bem que te fiz sorrir.
EliminarEu acredito que possam ter se amado. (à sua maneira)
ResponderEliminarÉ possível :)
EliminarHá diferentes formas de amar. A deles foi uma forma bem especial. :)
ResponderEliminarbeijinho
Isso foi :)
Eliminarbeijos
Tão bonito o texto. Lindamente escrito.
ResponderEliminarMuito obrigado Cisca.
EliminarÉ Amor é... a different kind of Love... mas não duvides que é amor..
ResponderEliminarBem visto.
EliminarPareceu-me que li a minha história. Ainda bem que também entendes que não é (apenas) um passado inocente que consubstancia uma grande amizade no presente.
ResponderEliminarPercebo isso muito bem. Ainda bem que gostaste :)
Eliminar:) Gostei do texto...
ResponderEliminarMas fiquei com uma sensação agridoce no fim... O que não é mau, é apenas diferente...
Beijinho
Nem todos os finais são felizes. Ou até são, mas de forma diferente do que se pensa. :)
Eliminarbeijos
Este comentário foi removido pelo autor.
EliminarO final cheira a agridoce, especialmente porque, aparentemente, o jovem (embora não seja liquido) não esta nas sete quintas da felicidade. O passado, bom ou mau, glorioso ou bastardo, só é amargo quando o presente assim o é também. O mesmo se aplica a todos os fins de relacionamentos...O que custa, sempre, é a perda, é saber que não se tem o que já se teve, é a falta. Mas não há insubstituíveis nem nada que o tempo não cure, desde que deixemos a feridas sarar.
ResponderEliminarGostei deste comentário :)
EliminarMaravilhosamente escrita esta pequena grande história. Há muitas formas de amor, e conforta-me acreditar que também eles se amaram, de um modo muito especial... típico de uma idade que não volta!
ResponderEliminarTenho acompanhado o blog sem me manifestar até hoje, mas hoje não consegui ficar "calada"! Muito bom!
Obrigado Vannya. Acredito que eles tiveram o seu amor. E que talvez a história deles não fique por aqui :)
EliminarÉ verdade nem todos os finais são felizes, mesmo quando o amor é verdadeiro e sólido, basta algo para mudar tudo mudar. Emigrar quebra o laço.
ResponderEliminarTens razão.
EliminarEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarFantástico :) O amor não se explica ... acima de tudo sente-se :)
ResponderEliminarÉ isso mesmo :)
EliminarNunca se deve voltar onde (com quem, acrescento eu...) já se foi feliz... é uma daquelas verdades universais, já muito "batidas", mas é tão verdadeira (passo a redundância) que dói entendê-la. Mesmo que mal resolvida, nunca voltar a uma mesma estória.
ResponderEliminarÉ o que vamos ver :)
EliminarNão vai continuar?
ResponderEliminareu fiquei com vontade de saber mais,
Vai!
Eliminarque historia envolvente. gostei imenso do fim :)
ResponderEliminarFiquei feliz :)
EliminarBrilhante...confesso-me rendida ao enredo que criaste...e pergunto, esta "raiva" dela não terá contornos mais profundos?
ResponderEliminarPor o ter deixado partir...por não ter lutado por ele? porque no fundo se apercebe que ela também é um fantasma dela mesma, pois não consegui seguir em frente...Porque ele,a lembrança dele sempre a acompanhou?
Por favor não pares agora de escrever ;)