No texto que escrevi sobre amor,carreiras e prioridades defendi que o amor, por mais complicado que
seja, pode ser conjugado com a aposta numa carreira de sucesso.
Acho que uma coisa não invalida a outra. Nos comentários mantive um
pequeno diálogo com o Rui Pi, que falou da possibilidade de no
futuro a resposta para a pergunta “o que és?” ser apenas uma
profissão. Eu coloquei outro cenário. Uma pessoa chegar aos oitenta
anos, fazer esta pergunta a si próprio e não ter resposta para ela.
Acredito que por volta dos oitenta anos
(ou até mais cedo) todas as pessoas pensam na vida e no caminho que
percorreram até aquele momento. Nessa altura, existem duas respostas
que se destacam de muitas outras. Por exemplo, uma pessoa pode
perguntar a si mesma “quem sou?” e ter como resposta um
empresário de sucesso. Que tem uma bela moradia. Um carro de luxo.
Uma conta bancária recheada. E o guarda fatos repleto da melhor
roupa que o dinheiro pode comprar.
Só que esta pessoa percebe também que
não tem ninguém a não ser a empregada de limpeza para dividir a
casa. Que não tem ninguém para passear a seu lado no carro de luxo.
Que não tem ninguém com quem gastar o dinheiro nem sequer tem
ninguém a quem deixar o dinheiro quando chegar a hora da sua morte.
E que não tem nenhum sítio a visitar com a sua roupa de marca,
excepto o restaurante do costume onde tem por hábito almoçar.
Depois, existe aquele velho que faz a
mesma pergunta. E que tem como resposta um emprego nem sempre bem
remunerado, que deu muito trabalho mas que permitiu amealhar o
dinheiro suficiente para uma vida dentro do que planeou. Uma casa
suficientemente boa. Um carro modesto e económico. Uma conta
bancária que permite respirar e dormir sem dores de cabeça. E um
guarda fatos com meia dúzia de peças mais caras.
Mas esta pessoa ainda se vai lembrar da
miúda de quem gostou mas que sempre o ignorou, levando a que
deixasse de acreditar no amor. Irá recordar aquela que o enganou com
um amigo e que o deixou literalmente na merda. Vai sorrir ao pensar
no momento em que disse que nunca mais amava ninguém. Vai adorar
recordar o momento em que conheceu a mulher que lhe ensinou o que é
amar e com quem ainda hoje partilha a vida. Vai chorar ao relembrar o
momento em que foi pai pela primeira vez. E a segunda gravidez da
mulher, muito mais tranquila. Vai dar razão aqueles que dizem que
ser avô é tão especial como ser pai. Provavelmente irá lamentar o
momento em que não deu mais de si num ou noutro cargo mas
rapidamente esquece isso ao olhar para a mulher, para os filhos e
para os netos que estão lá em casa para celebrar o Natal.
Entre estes dois cenários, não tenho
qualquer dúvida de que quero ser o segundo velho. Com isto não
quero dizer que não pretendo aplicar-me no trabalho. Ou que quero
ganhar apenas dinheiro suficiente para pagar as contas ao final do
mês. A questão não é essa. Aquilo que sei que não quero é ter
apenas uma profissão a definir-me enquanto pessoa. Não quero estar
sozinho. Não quero não ter histórias para contar e sobretudo não
ter ninguém a meu lado para as ouvir. Cada qual sabe das suas
prioridades. As minhas estão bem definidas. E este segundo velho sabe do que falo.
Adorei!
ResponderEliminarObrigado.
EliminarEu também prefiro ser a segunda pessoa, sem margem para dúvidas...
ResponderEliminarE tenho medo da primeira.
EliminarNós só damos mesmo importância ao que importa, quando a vida nos prega partidas.
ResponderEliminarQuando me vi numa cama de hospital, passou 2, 3 semanas e melhorar nada, a família ía me visitar e apesar de se mostrarem felizes e tentarem animar-me eu percebia que cada visita poderia ser a ultima.
E quando estamos num hospital, a hora da visita é o que mais importa, tudo o resto é difícil de gerir, ouvimos pessoas a morrer, outras antes de isso acontecer a sofrer e pensamos tudo e mais alguma coisa.
E estou a contar isto porquê?
Porque eu estupidamente, quando estava naquela cama sem me poder mexer, pensava quem vai ficar com a minha casa, o meu carro, os meus segredos que guardo numa caixinha no fundo do roupeiro?
Que parva fui!!!
Nada disso era importante, comparado a eu não conseguir respirar sem ajuda artificial.
O que contava mesmo eram aqueles abraços, aquelas palavras de quem gostava de mim na hora da visita!!
Somos o que vivemos e cativamos...
por razões que não importam, perdi a casa, o carro, dinheiro, mas fiquei eu , e com a ajuda de quem cativei,preservei, voltei a querer viver e apesar de hoje ainda não ter a minha casa o meu carro, sei quem está e vai estar sempre ao meu lado.
Por isso devemos ser bem sucedidos profissionalmente,mas sem duvida os afectos , são os nossos alicerces.
Assusta-me a forma como hoje em dia as pessoas na grande maioria são desligadas umas das outras...
Peço desculpa pelo abuso deste comentário extenso.
Obrigada
Mulher Sem Sono
Um exemplo "fantástico" dentro daquilo de que falei. Obrigado pela tua partilha.
EliminarGostei muito deste texto! E a verdade e que concordo plenamente com a tua opiniao. Todo o empenho e dedicacao numa profissao so valem a pena se poder chegar a casa e ter com quem partilhar quer os sucessos quer os fracassos!
ResponderEliminarPor muito que se diga o contrario acho que ninguem e completamente feliz se apenas tiver uma "face da moeda".
Penso como tu.
Eliminarpeço desculpa mas se puder não publique o meu comentário.
ResponderEliminarMulher Sem Sono
Acho que deste um belo exemplo mas se quiseres, diz-me que apago o comentário.
EliminarO meu pai tem 82 anos.
ResponderEliminarE não é nenhum desses velhos.
É um homem que trabalhou afincadamente e com brio até à reforma. E que incutiu nas filhas o valor do trabalho, a satisfação que dá fazermos um trabalho bem feito. Mas ao mesmo tempo nunca deixou margem para duvidarmos de que a família estava sempre em primeiro lugar.
Depois de se reformar continuou sempre activo. Faz voluntariado, convive com pessoas muito mais jovens (diz que não tem paciência para velhos!), ainda transporta os netos de cá para lá. Tem saúde para dar e vender e uma memória prodigiosa. É o pilar das nossas vidas.
Esqueço-me da idade dele. Só quando leio estes textos é que me ocorre que o meu pai já é velho. Ou melhor, está nessa categoria. Porque na verdade há gente mais nova do que eu que é mais velha do que ele.
E sendo assim, ele é o velho que eu espero conseguir vir a ser. :-)
O teu pai é um belo "velho" e assim é que deve ser. Espero que sigas o seu caminho.
EliminarO meu pai tem 82 anos.
ResponderEliminarE não é nenhum desses velhos.
É um homem que trabalhou afincadamente e com brio até à reforma. E que incutiu nas filhas o valor do trabalho, a satisfação que dá fazermos um trabalho bem feito. Mas ao mesmo tempo nunca deixou margem para duvidarmos de que a família estava sempre em primeiro lugar.
Depois de se reformar continuou sempre activo. Faz voluntariado, convive com pessoas muito mais jovens (diz que não tem paciência para velhos!), ainda transporta os netos de cá para lá. Tem saúde para dar e vender e uma memória prodigiosa. É o pilar das nossas vidas.
Esqueço-me da idade dele. Só quando leio estes textos é que me ocorre que o meu pai já é velho. Ou melhor, está nessa categoria. Porque na verdade há gente mais nova do que eu que é mais velha do que ele.
E sendo assim, ele é o velho que eu espero conseguir vir a ser. :-)
Desculpa o comentário duplicado.
Eliminar"Cenas" do android...
chegar a esta velhice (a descrição em segundo plano), parece ser um desejo que muito se quer seja realidade. à primeira leitura pareceu-me um nadinha estereótipo, mas depois, não. é só mesmo um querer, que pode muito bem acontecer. oxalá.
ResponderEliminarNão se trata de nenhum estereótipo. Assumo que tenho medo do primeiro e que quero ser como o segundo.
EliminarComo eu concordo contigo!!!
ResponderEliminarÉ um assunto interessante e nos dias que correm sem dúvida pertinente.
De há uns tempos para cá também aprendi a relativizar , mudei, e sei que faz sentido sim ser uma velha assim :-)
Há muitas coisas na vida que alteram por completo a nossa forma de pensar.
EliminarComo te compreendo.
ResponderEliminarE partilho da mesma escolha.
Tive uma carreira de sucesso, depois casei e tive filhos. Ao 3ª fui despedida da multinacional. Deixei de ter o dinheiro que tinha. Hoje arranjei um emprego mais modesto.
Mas olho à volta e tenho 3 filhos fantásticos. Oiço as suas gargalhadas e canções todo o dia e vi que valeu a pena.
e ainda me faltam quase 40 anos para os 80!
vidademulheraos40.blogspot.com.
E isso vale tudo, não é?
EliminarVale mesmo! :)
EliminarEm primeiro lugar, obrigado pela publicidade (estou quase quase a ser blog da moda! :P)
ResponderEliminarQuanto ao texto: ideal, ideal era uma mistura dos dois velhos. Um híbrido com um bom carro para passear com a família toda bem vestida, todos a almoçar na casa com piscina enquanto se partilham as histórias da namorada que o deixou na merda e da facilidade da segunda gravidez.
Mas, na realidade, o que eu acho é que as pessoas têm que se sentir bem com as prioridades que dão às suas vidas. É essa falta de perspectiva que deixa, muitas vezes, as pessoas infelizes. Na prática a prioridade é a carreira, mas na velhice apercebem-se que, no fundo, queriam outra coisa. E vice-versa.
Não prefiro ser o primeiro velho, nem o segundo velho. Prefiro ser o velho que quero ser!
Não tens de agradecer nada :)
EliminarSim, uma mistura dos dois era algo positivo. Só não quero ser igual ao primeiro velho. Isso assusta-me.