a forma, mais honesta possível, de explicar o que se passou ontem

A ruptura total do tendão de Aquiles impediu-me de fazer algo que faço sempre que o Benfica é campeão e que passa por ir ao Marquês festejar com os adeptos e jogadores. Este ano tive de me contentar com os festejos televisivos. Algo que permite que tenha uma perspectiva melhor sobre o que aconteceu no Marquês.

Basicamente, acho que todas as pessoas estão de acordo no que diz respeito à impossibilidade lógica de olhar para aquele grupo de pessoas como sendo a generalidade dos adeptos do Benfica. E o mesmo se aplica a todos os clubes pois problemas existem em todos os lados. E qualquer pessoa num rápido exercício de memória recorda casos, sem sair de Portugal, dos outros dois grandes clubes nacionais: Porto e Sporting. E esta lógica aplica-se igualmente aos agentes da Polícia destacados para aquela zona.

Na televisão vi adeptos que queriam festejar. Vi adeptos (que não o são) que só queriam confusão. Com a polícia ou com outros adeptos. Vi polícias preocupados com a ordem e vi polícias preocupados em apagar o fogo com gasolina. Se acho inadmissível que um adepto arremesse pedras e garrafas para cima de outros adeptos (e polícia) acho igualmente inadmissível que um polícia comece a bater em pessoas que simplesmente estão a passar à sua frente, que os mande para o “cara***” e que use o bastão para simular um pénis que agita na direcção dos adeptos. Existem culpados dos dois lados e só lamento pelas pessoas que estavam ali para se divertir e que se viram envolvidas num problema que não é era seu.

Lamento também a forma como a comunicação social deu cobertura ao que estava a acontecer. A partir do primeiro incidente foi totalmente ignorada a festa. Parecia que estava a ver uma reportagem sobre um motim. Os jogadores do Benfica estavam no palco e foram ignorados por completo. Nem sequer foi mostrado o capitão (Luisão) no momento em que tentou acalmar as pessoas. Não digo que se esconda o que aconteceu. Não pode nem deve ser esquecido. Mas não deve ser igualmente esquecido o motivo daquele directo de largas horas que passa pela festa de um clube. Mostra-se uma aplicação que deixa ver onde está o avião durante a viagem entre o Porto e Lisboa mas ignoram-se os jogadores no palco. Acho que poderia existir um equilíbrio que foi esquecido em detrimento da “miséria”.

O futebol mexe muito com as pessoas que, por norma, cegam no momento de fazer uma análise minimamente justa sobre algo. Provavelmente existirá quem não ache lógica nenhuma às palavras que vou partilhar agora. Mas considero que o comunicado de Luís Filipe Vieira, presidente do Benfica, é a forma mais honesta possível de resumir e explicar aquilo que aconteceu ontem. Está tudo aqui. E são palavras que se aplicam ao Benfica hoje mas que podem aplicar-se a qualquer clube ou incidente do género no futuro.

"Devo um agradecimento muito especial a todos os benfiquistas que, de norte a sul do país, de Timor a Luanda, de Paris a Toronto, festejaram a conquista deste título. As imagens que vi pela televisão, as imagens que presenciei ao vivo em Guimarães, no Porto ou em Lisboa deixam-me orgulhoso porque demonstram a dimensão do Clube, a sua grandeza, mas principalmente a grandeza dos seus sócios e adeptos. Este título não foi ganho contra ninguém, é um título de todos aqueles que gostam de futebol. É um título de todos os benfiquistas, estejam eles onde estiverem.

Devo confessar igualmente alguma frustração. A frustração de quem já viu as imagens da criança que em Guimarães assistiu à detenção do pai de forma violenta e sem razão aparente, a frustração de quem viu os incidentes que interromperam os nossos festejos no Marquês nesta madrugada. O futebol não pode pactuar com qualquer tipo de violência, é preciso apurar responsabilidades. É preciso que os responsáveis pela violência da noite passada sejam identificados e punidos. O futebol não precisa dos que ontem provocaram as cenas que vimos.

Vi milhares de jovens, centenas de crianças, famílias inteiras a festejar no Marquês. Foi para isso que trabalhámos durante todo o ano, foi para isso que idealizámos tudo o que foi preparado no Marquês. Infelizmente, uma minoria tentou estragar tudo aquilo que preparámos. Não sei se são benfiquistas ou apenas um grupo de vândalos profissionais. Sejam o que forem, têm de ser responsabilizados pelo que fizeram. O futebol não precisa deles.

Quanto às forças de segurança, também há imagens que devem merecer a atenção e a abertura de inquérito por parte do Ministério da Administração Interna. É preciso apurar se, não houve, em alguns momentos, excessos por parte das forças de segurança.

A minha palavra final é um apelo para a comunicação social. Não reduzam as celebrações do 34.º título de campeão nacional do Sport Lisboa e Benfica aos incidentes da madrugada. A equipa não o merece, e os adeptos – 99,99% – também não!

Luís Filipe Vieira".