3.4.14

is this love? (capítulo dezasseis)


Alexandra acabara de sair do consultório. O medo de que tivesse algum problema ou pior, que o bebé tivesse algo grave tinha dado lugar a um alívio que se traduzia em alegria que por sua vez se espelhava num rasgado sorriso. Mesmo depois do telefonema para Miguel, a avisar que tudo estava bem, não conseguia parar de sorrir, atraindo os olhares das pessoas com quem se cruzava enquanto caminhava. A sua alegria era de uma rara dimensão. Tanto que quem olhava para Alexandra não evitava esboçar um sorriso, como que contagiado pelas suas boas vibrações.

Nem o facto de estar a ser consumida por uma nova dúvida fazia com que o seu sorriso esmorecesse. “Gostava tanto que fosse uma menina”, era aquilo em que pensava. “As roupas são mais giras. A oferta é muito maior e sempre quis ter uma menina. Já estou a imaginar, nós duas a escovar os cabelos uma da outra. Vai ser tão giro”, era aquilo que ia dizendo numa espécie de monólogo que em alguns momentos chegava a ser audível, apesar de Alexandra pensar que não passavam de meros pensamentos despidos de som.

Pouco tempo depois chegava a casa. Meteu a chave à porta e assim que a abriu encontrou Miguel. Quando os olhos se cruzaram, ele chorou. Nada disse e abraçou-se à namorada. Continuavam sem nada dizer. Mas o abraço dele ia aumentando de intensidade. Era cada vez mais forte. Mas Alexandra não se sentia apertada. Sentia-se protegida. Agarrada pelas duas únicas mãos do mundo que conseguem exercer esse poder sobre ela. O abraço foi ficando cada vez mais fraco. Não que Miguel quisesse largar Alexandra. Mas porque queria passar a mão na barriga da namorada. 

Meio tímido, com o receio típico de um homem que praticamente nada sabe sobre a gravidez e que teme que qualquer acto, por mais banal que seja, possa ser prejudicial, tocou ao de leve na barriga de Alexandra. Apenas com uma mão. Que gentilmente e suavemente percorria o ventre da namorada. As lágrimas continuavam a escorrer pelo seu rosto. E as palavras ganharam vida. “Tinha tanto medo que algo estivesse mal. Só pensava em coisas parvas”, sussurrou-lhe ao ouvido. “Está tudo bem. Não vale a pena ficares assim. Já passou”, respondeu Alexandra, num tom igualmente baixo, enquanto passava a mão pela cabeça de Miguel.

Já mais calmos, deram continuidade ao resto do dia. E todo aquele medo acabou por se diluir com o passar dos dos minutos. Até que deixou de existir. E assim foram os dias seguintes. E as semanas que se seguiram. Depois de muito tempo de turbulência e de amores e desamores, Alexandra e Miguel concordavam que viviam aquela que era a melhor fase das suas vidas. “Se um dia, um pintor quiser passar a perfeição para um quadro, pode vir ter connosco e passar este momento para uma tela. Se existe perfeição, é isto que estamos a viver”, costumava dizer Miguel. Alexandra desatava às gargalhadas. Emocionava-se com o que ouvia mas escondia essa emoção no sorriso como quem tem medo de estragar aquilo que tem. “Não te rias que estou a falar a sério”, acrescentava Miguel sem perceber que a atitude da namorada era uma mera defesa.

Os momentos tranquilos eram agitados quando decidiam falar sobre o sexo do bebé. Para Alexandra, seria uma menina. Por sua vez, Miguel queria um menino. “Vai ser uma menina linda como a mãe. Vai chamar-se Carolina. E vai ser o teu terror quando crescer pois vai partir muitos corações”, gracejava Alexandra. “Isso querias tu. Vai ser um menino. Vai chamar-se Bernardo e vai ser o melhor jogador de futebol de todos os tempos. Vai ser capitão do Benfica, onde vai conquistar muitos troféus. Apesar das propostas milionárias, vai ficar sempre no clube do seu coração e vai ser campeão do mundo por Portugal”, respondia Miguel. “Adoro essa tuas divagações. Olho para ti e facilmente percebo que imaginas detalhadamente aquilo que dizes”, referia Alexandra.

“A roupa para as meninas é muito mais gira, assim temos mais por onde escolher”, defendia Alexandra. “Nisso tens razão mas vai ser um menino e vai ser lindo como o pai”, insistia Miguel. Assim eram passados os dias do casal. As discussões em torno do sexo do bebé era constantes. E talvez por causa delas, tanto Alexandra como Miguel nunca abordavam a remodelação do quarto, até então escritório, para receber o primeiro filho de ambos. Nem sequer compravam roupa ou acessórios. A excepção era uma única chucha que criava a ilusão de que o bebé tinha um farto bigode. De resto, ocupavam o tempo com as argumentações que serviam para justificar o porquê de desejarem uma menina e um menino.

De conversa em conversa, o tempo foi passando. E rapidamente chegou o dia da ecografia das 16 semanas onde Alexandra e Miguel iam ficar a saber o sexo do bebé. Enquanto se deslocavam para o consultório, continuavam a discutir, de forma animada. “É uma menina”, dizia Alexandra. “É um menino”, dizia Miguel num longo diálogo que não passava da repetição destas curtas frases. Chegaram na hora marcada. Não tiveram que esperar muito tempo e pouco tempo depois estavam a segundos de finalmente saber se era uma menina ou um menino. “Parabéns, vão ter....”

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