Permaneciam no carro. Ela extasiada.
Sorridente. Estava num carro. Mas a sua mente estava noutro lugar
qualquer bem mais romântico do que o interior de uma viatura que tem
um aroma, suave mas incomodativo, a tabaco. A companhia seria a
mesma. Mas o cenário seria completamente distinto dos bancos de
pele. Da manete das mudanças com uma bola preta com o número oito
ao estilo da bola mais desejada dos jogadores snooker. Por ela,
estariam a quilómetros dali. Numa praia idílica seria perfeito. Já
ele divide-se num misto de sensações. Por um lado, a satisfação
extrema perante algo que não passava de um simples sonho. Parece que
não acredita que os corpos ainda há pouco minutos estavam colados
numa sintonia perfeita, sendo apenas um. Por outro lado não percebe
o que acabou de acontecer. Os motivos que os levaram até ali. Até
porque, que ele saiba, ela tem um namorado.
Ela impediu-o de falar. Pediu-lhe um
abraço. Disse não querer julgamentos. Eles respeitou tais pedidos.
Mas a verdade é que há precisamente 23 minutos que não falavam um
com o outro. Ele consegue precisar o tempo porque não tirou os olhos
do relógio enquanto divagava no meio de tantas dúvidas. “Sei que
me pediste para não dizer nada. E para não te julgar mas tenho de
te perguntar isto. Não te vou julgar. Nem sequer questionar o que
quer que seja. Mas preciso de saber porque decidiste fazer isto se tens namorado. Espero que percebas o que te digo”, disse.
“Sabia que terias de falar nisso. No teu lugar faria o mesmo.
Aliás, nem sei se tens alguém neste momento ou não. Mas digo-te
que decidimos dar um tempo à relação depois daquela zanga. E isto
que acabou de acontecer entre nós prova que não seria feliz com
ele. Sou incapaz de voltar para ele. E, caso o fizesse, teria de
contar o que tinha acontecido. E isso ia dar-lhe motivos para me
chamar ainda mais nomes, para me acusar de ser uma oferecida e aposto
que diria que tinha razão para desconfiar de ti. E isso é algo que
não quero. Por isso, não tens que te sentir mal com nada”,
referiu.
“Quero que fique bem claro que adorei
o que acabou de acontecer entre nós mas sinto-me confuso. Fizeste
com que me sentisse mal. Senti-me a maior merda do mundo. Vim ter
contigo a medo e a noite acaba desta maneira. Neste momento
comparo-te a um chocolate que acabei de desembrulhar e dar uma
dentada. Sendo que não sei se vou comer o chocolate todo ou se
alguém me vai roubar o bocado que falta”, tentou explicar ele num
jeito atabalhoado. Algo a que ela está habituada porque ele nunca
teve jeito para conversas destas. De sorriso nos lábios, ela disse
perceber o que ele queria dizer. “Sabia que te queria. Sabia que
desejava isto mas não planeei nada do que acabou de acontecer. O
motivo que me levou a querer estar contigo foi outro”, explicou.
“Como assim?”, perguntou ele com medo da resposta que podia
ouvir.
“Sabes que sempre tive o sonho de
sair de Portugal. De mudar de país. E soube ontem que fui
seleccionada para trabalhar numa empresa de Miami. Sou uma das dez
pessoas escolhidas para um estágio remunerado de dois anos. No
final, ficam com três pessoas. Fui ter contigo para te contar isto.
E também para me despedir de ti. Pois a partida é para a semana.
Mas o desejo falou mais alto e...”, disse, sendo interrompida por
ele. “Espera. Tu fazes com que me sinta uma merda. Depois fazes com
que me sinta especial. E agora dizes-me adeus que vais para Miami. O
que se segue? Vais perguntar se espero por ti durante este tempo
todo?”, perguntou, visivelmente chateado.
“Eu não planeei isto. Desculpa. Cedi
ao que sempre tinha controlado. E não me arrependo disso. Mas se
quiseres que fique eu recuso a oferta. Basta que o digas. É o que
queres?”, inquiriu. “Gosto muito de ti. Mais do que pensava ser
possível. Mas estás a colocar o peso do mundo nos meus ombros.
Estás a dar-me o poder de decidir a tua vida. De dar continuidade ou
matar algo que sei que sempre quiseste. Isso é muito para mim”, respondeu. “Eu não quero nada disso. Só quero que me
digas que me amas e que desejas que fique contigo. Se o disseres, o
meu sonho passa a ser outro nesse preciso momento”, referiu. Ele
levantou a cabeça. Olhou-a nos olhos. E a chorar respondeu...
“Amo-te muito...” “Era isso que queria ouvir”, disse ela,
interrompendo aquilo que ele dizia. “Espera. Amo-te muito. Mas não
quero que fiques comigo. O teu sonho é maior do que qualquer amor. E
não quero destruir nada. Nem quero que mais tarde me acuses de ter
destruído algo. Agora sou eu que te peço que não digas nada”,
disse-lhe, arrancando bruscamente com o carro.
A distância até à casa dela não era
superior a cinco, seis quilómetros. Mas, para ambos pareceu a viagem
mais longa e penosa do mundo. Não se ouviu uma única palavra. Nada.
Apenas as lágrimas dela, que se seguiram às dele quando lhe disse
que a amava mas que preferia que se fosse embora. Minutos mais tarde
chegavam à rua dela. Ele parou o carro mesmo em frente ao prédio
dela. “Por favor não me digas nada”, pediu-lhe. O choro dela
acentuou-se. “Porquê? Acredita que não queria que esta noite
fosse assim. Só quero ouvir-te dizer que não queres que apanhe o
avião. Diz-me isso. Diz isso por favor. Se me amas diz”,
pediu-lhe. “Já te disse. Amo-te muito mas quero que apanhes o
avião e que sejas feliz a fazer o que tanto gostas”, foram as
palavras dele. Ela abriu a porta e saiu. Antes, disse-lhe que o avião
partia dali a seis dias, às 12h20. “Que tudo te corra bem. Irei
amar-te para sempre”, disse, arrancando com o carro segundos depois. Ela,
permaneceu imóvel, a chorar enquanto viu o carro desaparecer no
escuro da noite.
Olá!
ResponderEliminarTenho vindo a seguir capítulo a capítulo esta estória, bem contada, de agradável leitura.
Gosto!
Aguardo novo desenrolar dos acontecimentos.
Ainda faltam uns dias para a data da partida.
Vamos esperar para ler o que acontece.
Obrigada pela partilha.
Fico feliz por gostares :)
EliminarVamos ver no que isto dá!
Obrigado eu.
Fantástico blog, vou continuar a acompanhar. Os homens não são todos iguais. Forte abraço
ResponderEliminarAinda bem que gostas. E sim, os homens não são todos iguais.
EliminarAbraço
"Cyborg"
ResponderEliminarDoeu, porque foi exactamente o que pressenti, triste sina, parece a história da minha vida. Aguardo pelo restante desenrolar!
Bjs
Não sei o que será da vida destes dois.
Eliminarbeijos
"Cyborg"
EliminarNem eu. Tornou-se de repente tão incerto. Nem todas as histórias felizes duram, e existem outras que suportam a distância. Pelo menos na minha história, é uma certeza, após a partida, tudo ter-se-à terminado. Escolhas difíceis que exige discernimento quando o factor sobrevivência fala mais alto que todas coisas, inclusive o amor.
Bjs
Vamos ver no que dá :)
EliminarEstou sem palavras...
ResponderEliminarEm parte, porque revi alguns momentos da minha vida nesse texto :/
Mais uma vez a surpreender. Abraço
Queres contar quais as partes?
EliminarAbraço
Sentir-me usado - check
EliminarDeixar alguém perseguir um sonho - check
Gosto dele. Ama mas não prende... Não estava à espera deste desfecho.
ResponderEliminarEspero por mais claro :)
Quem ama não prende. Acho eu :)
EliminarUiii... eu ja crio filmes na minha cabeça... ja tenho mil e uma ideias para um sexto capitulo.. oh.. adoro como escreves! :) Continua!!!
ResponderEliminarBeijinho
Vamos ver no que dá.
EliminarObrigado pelas palavras.
beijos
"Espera. Amo-te muito. Mas não quero que fiques comigo. O teu sonho é maior do que qualquer amor. E não quero destruir nada. Nem quero que mais tarde me acuses de ter destruído algo. Agora sou eu que te peço que não digas nada”, disse-lhe, arrancando bruscamente com o carro." - Isto É amor... :)
ResponderEliminarVamos ver o que é :)
EliminarQue... Totós.
ResponderEliminarEla colocou a decisão de viver os seus sonhos nas mãos de alguém por quem nem sabia estar "apaixonada" antes de ser arrebatada por um impulso carnal (meia hora antes, portanto). Ou, se quisermos, colocou as decisões da sua vida nas mãos de alguém em nome de um amor que se esconde atrás de uma relação com outra pessoa (o ex), e que espera pacientemente durante anos que essa pessoa cometa um erro para, então sim, se libertar mas avançar não para os braços do grande amor mas para uma despedida definitiva dessa pessoa. Interessante. Ou seja, ela não viu a grande relação amorosa em potencial que ali estava assim que ficou livre como um passarinho e tinha o cérebro a funcionar em pleno sem distracções de cariz... biológico, mas depois sim, já valia a pena atirar tudo para o ar para viver aquela linda história de meia-hora. Realmente, apesar de curto, foi um momento especial e único; ele não viveu a mesma coisa -- breve & carnal -- com 153 pessoas diferentes no último ano. Oh wait... Hmm...
E por falar nele... Entretanto, ele que já a amava há imenso tempo (apesar de dormir com todas que lhe davam bola num raio de 100km) e até se metia nos copos no final do dia por causa dela (muito sofrimento), achou que continuar a enfrascar seria muito melhor opção do que fazer as malas e ir com o amor da sua vida viver um sonho dela (e potencialmente construir o seu, ao lado desse grande amor). Ou seja: "Amo-te... desde que não tenha de sair da minha zona de conforto, tonta. Isto de mostrar que se ama é muito cansativo e, convenhamos, eu até tenho uma lista simpática de números de amigas no ombro de quem chorar". E vai embora a mil a hora (esperou anos para ter aquela conversa com ela, mas assim que teve a chance: foi embora o mais depressa que pôde. Qual era a pressa? Fugir da possibilidade de compromisso que se abriu?), desejando-lhe que corresse tudo bem (ahahaha), e notoriamente estupidificado para achar normal deixar o amor da sua vida a chorar no escuro, no meio da rua!
O amor deles é muito bonito, de facto :P
"achou que continuar a enfrascar seria muito melhor opção do que fazer as malas e ir com o amor da sua vida viver um sonho dela (e potencialmente construir o seu, ao lado desse grande amor)."
EliminarNão podes fazer por menos... Tens que dizer aquilo que eu penso...! :$
Adorei :)
EliminarDevem ser as minhas hormonas que andam malucas, mas quase choro com esta história... O amor, ou os Homens conseguem fazer coisas mesmo estúpidas!
ResponderEliminarEscreves muito bem, Parabéns!
Muito obrigado Filipa. Nem sei que te diga.
EliminarUma história mesmo como eu gosto, e como já não leio há muito tempo... O problema? Continua a não dar para virar a página e ver o que vem a seguir...
ResponderEliminarE como contra factos não há argumentos... fico à espera do próximo capitulo...
Beijinho
Vamos ver no que dá isto.
Eliminarbeijos
Não gostei do término do capítulo cinco...achei-o meio que arranjado para continuar com a história...Que sonho de vida é este, que ela tem e só nos conta agora?...Ok não houve espaço para frizar, poderia ser...mas e a relação anterior evaporou?...ela largou o namorado assim, quase do nada?...Agora te amo mas tenho de partir...Não gostei do término do capítulo 5...
ResponderEliminarPost Scriptum...A cena de sexo foi única!
Compreendo-te mas existem coisas sobre eles que ainda não foram contadas. Este sonho dela era uma delas. Vamos lá ver no que dá :)
EliminarQuem ama não cobra.
ResponderEliminarRespeita :)
Verdade!
EliminarEstou a acabar de conhecer este blogue. Estou a A-D-O-R-A-R!!!!
ResponderEliminarPor um amor sem escolhas. Que o que haja para prender entre estas 2 pessoas seja o amor, somente isso.
Felicidades :)
Beijinhos
Muito obrigado pelas tuas palavras :)
Eliminarbeijos