4.10.13

a pressão do corpo perfeito (e não só)

Quando era miúdo sonhava ser jogador de futebol. Mais especificamente do Benfica. Era o meu sonho. Mas apenas isso. Nunca uma obsessão. Sabendo que era algo de que gostava imenso, os meus pais fizeram os possíveis para que me sentisse feliz. Recordo-me de ir de autocarro com a minha mãe até Corroios para fazer treinos de captação. Tenho bem presente as horas à seca que o meu pai apanhava à minha espera no final de mais um dia de trabalho. Para mim, eram três treinos por semana. Para o meu pai, eram longos minutos de espera pois era quase sempre dos últimos a sair do balneário. Além disso, recordo-me de ter sempre o apoio deles. Em todos os campos onde joguei. Se os meus pais falharam três jogos meus foi muito. Podiam estar quase 40º ou 3º que eles estavam lá para me apoiar.

Apesar de tudo isto, os meus pais foram os primeiros a fazer com que o meu sonho nunca fosse uma obsessão. Alertavam-me para o mundo cão que era o futebol. Faziam questão de deixar bem claro que era possível viver do futebol mas que isso seria uma missão quase impossível. Para eles foi sempre importante que me concentrasse nos estudos. Pois era ali que estava o meu futuro. E não num rectângulo quase sempre de areia. E algumas vezes de relva. Mesmo nas minhas melhores épocas, com destaques em jornais e distinções na rádio eles faziam questão de reforçar que era um mundo complicado. E hei-de agradecer isso até ao final dos meus dias. Porque recebi os melhores conselhos que poderia ter recebido.

Quanto tento recuar aos tempos de adolescência, de modo a relembrar-me das minhas colegas também não encontro obsessões. Até me recordo da minha turma achar que uma amiga nossa dava uma excelente manequim. Porém, ela não partilhava a nossa maneira de pensar. Tivemos de ser nós a inscreve-la num concurso que acabou por ganhar e que fez com que vivesse alguns bons momentos na moda e televisão. E não me recordo de nenhuma colega minha viver obcecada com padrões de beleza. Quanto muito, com estudos. Aí sim. Notava-se a pressão em alguns colegas. Já eles, eram quase todos jogadores de futebol. Ou de andebol. Mas sem qualquer obsessão em torno disso. Era uma maneira de ocupar o tempo livre.

Hoje, tudo é diferente. Infelizmente, algumas meninas crescem com a obrigatoriedade de serem isto ou aquilo. Ou porque os pais querem que sejam aquilo que não foram. Ou porque lidam com anúncios e séries que remetem para padrões de beleza que se vêem obrigadas a cumprir de modo a que não fiquem perdidas no meio da multidão. Por sua vez, os meninos desde cedo são obrigados a estar inscritos numa escola de futebol. Mesmo que prefiram brincar com carros têm de ir jogar futebol. E não basta jogar. Têm de ser o novo Messi ou Cristiano Ronaldo e ganhar milhões com o desporto. Isso é o mínimo que podem fazer. E isto é algo assustador. Por exemplo, mais de 80% das meninas norte-americanas de dez anos têm medo de serem gordas. Já na faculdade, e aqui estamos a falar de “mulheres”, entre 40 a 70% das alunas não gostam de duas ou mais partes dos seus corpos.

Neste sentido, a autarquia de Nova Iorque lançou uma campanha inédita que tem por objectivo fazer com que as meninas entre os sete e doze anos se sintam bem na sua pele. Em 15 anúncios podem ser vistas diferentes crianças. Brancas, latinas, afro-americanas e asiáticas. Umas praticam desporto, outras jogam xadrez, algumas com peso a mais, outras com aparelho nos dentes e uma delas numa cadeira de rodas. Tiro o meu chapéu a esta campanha que deveria ser mundial.




Espero que muitos pais se cruzem com esta campanha. Porque há tempo para tudo na vida. E em tenra idade há que crescer e ter tempo apenas para uma coisa: ser criança. Não existe nenhum pai no mundo que consiga dar felicidade a um filho ou filha quando os obriga a seguir determinados padrões e exige que sejam, no mínimo, os melhores do mundo.  

12 comentários:

  1. Verdade! Conheço muito bem os meandros das escolas de futebol e a obsessão parte sempre, mas sempre dos pais. De algumas crianças até tenho pena ..

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    1. São crianças que acabam por ficar tristes com algo que não querem fazer.

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  2. "Não me importo que não sejas a melhor, mas exijo-te que dês o melhor de ti!" Este é o parametro que imponho às minhas filhas. Não me interessa que sejam "a melhor da turma", importa-me que me digam "Mummy dei o meu melhor"...isso basta-me.
    Há um tempo para tudo. E por isso mesmo desde muito pequenas se habituaram a equilibrar o tempo de estudar, com o tempo de brincar, de estar com os amigos, de estar com os pais...ou de simplesmente consigo próprias.Sempre me opus a professores que contavam com o periodo da noite para as miúdas fazerem os TPC. Há um tempo para tudo na vida e até os adultos precisam de ser lembrados disso. Nunca autorizei mais do que uma ida a festas de aniversário por fim de semana. Porquê? Porque a família também precisa de tempo. Agora as meninas estão a crescer e eu tenho um dilema nas mãos que se avizinha com a mais velhinha. Ela quer perseguir um sonho, eu não a quero impedir de o fazer, mas por outro lado sei que vai ser muuuito duro. Resta-me deixa-la seguir o caminho que escolher, mas sempre tentando que não tire o pé do chão e jamais sair do lado dela, estar lá para o que der e vier. Elas (as minhas meninas) são especiais só por serem como são e eu faço o melhor que posso e sei para que ela sintam isso todos os dias.

    (Campanha absolutamente genial a que referes!)
    Jinhooossss
    Bom fim de semana

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    1. Bela frase. E passa por aí. Até para que a criança passe a querer ser a melhor. Que crie ela por si própria o desejo de triunfar. Mas que isso não seja uma obsessão imposta por alguém.

      A campanha é muito boa.

      beijos :)

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  3. Tão verdade. Os pais muitas vezes projectam nos filhos os sonhos que não realizaram. E, tentam levar os filhos a ter uma carreira de sucesso, sem trabalhar muito.

    nadinhadeimportante.blogspot.pt

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  4. Há alguns anos atrás a Dove lançou esta campanha - http://www.youtube.com/watch?v=9zKfF40jeCA

    Se descontarmos a hipocrisia comercial (a Unilever, marca mãe da Dove, também tem outro tipo de produtos que não respeitam o posicionamento desta marca), isto é mesmo um resumo do impacto/pressão a que as crianças, em especial do sexo feminino, estão expostas.

    Se a isso juntarmos a pressão familiar no sentido a que referes, muita da fragilidade psicológica que se encontra por aí começamente exactamente onde devia ser combatida - em casa.

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  5. Conheço alguns casos assim, de pais que projectam nos filhos aquilo que não conseguiram fazer/ser... São casos até demais, não são 1 ou 2... São tantos!!... E tenho tanta pena destas crianças que não conseguem sê-lo de verdade... É que tenho a comparação de quando eu fui criança, sem pressões nem obrigações de ser isto ou aquilo, com pais empenhados em que eu fosse feliz, porque assim, eles estavam felizes!!

    Sandra

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  6. É mesmo verdade!
    Continua a dizer que quando for grande quero ser como a Suri!
    Espero que a minha filha cresça saudável e a fazer o que gosta... Não a colocar em atividades só porque acho que é giro e está "in"... Ela é uma criança, sim, mas tem a sua personalidade... cabe-me a mim guia-la o melhor que consiga, tentar ajudar a limar as arestas, mas nunca limitar o sonho...

    Gostei da ideia da campanha!
    Beijinho!

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