então e filhos?

Este texto é dedicado a todas as pessoas que têm por hábito iniciar uma conversa (quanto muito esperam cerca de vinte segundos depois do início da conversa) com a pergunta: “então e filhos?” Encontra-se aquele amigo que não se vê há muito tempo. “Estás bem? Então e filhos?”, pergunta. Encontra-se um antigo colega do trabalho com quem nem se tinha uma grande relação. “Tudo bem? Então e filhos?”, pergunta. Visita-se aquele familiar que não se vê com tanta frequência. “Olá. Então e filhos?”, perguntam. “Então e filhos?”, é capaz de ser a pergunta mais ouvida por homens (e sobretudo mulheres) que entraram na casa dos trinta e que ainda não são têm filhos.

Ninguém quer saber do sucesso profissional. Ninguém quer saber se a pessoa tem uma profissão precária ou se está num confortável cargo bem remunerado. Ninguém quer saber se a pessoa tem realizado os sonhos e metas a que se propôs ao longo dos tempos. Ninguém quer saber como está a família. Ninguém quer saber nada de nada. Nem sequer se existe um namorado ou namorada, marido ou mulher com quem se tem uma relação estável para ter o tão desejado filho pelo qual todos perguntam. As pessoas querem filhos. Não interessa como. Nem vindos de onde. Nada interessa. A única coisa que interessa é que exista um filho. Ou muitos, de preferência.

Pois bem. Quem quer muito ter um filho, e ainda não o tem, será por alguma razão. Ou porque não encontrou a pessoa ideal com quem quer dar esse passo. Ou porque o casal não consegue engravidar. Ou porque o casal entende não ser a melhor altura para ter um filho. Quer seja por razões financeiras, profissionais ou outro motivo qualquer que não diz respeito a ninguém. Quando alguém pergunta a alguém por filhos, será que está preparado para ouvir a resposta. Será que essas pessoas estão prontas para dar continuidade à conversa se ouvirem algo do género: “acho que não é a pessoa certa para dar esse passo”, “andamos a tentar mas não conseguimos engravidar” ou “não temos dinheiro para ter um filho”? Será que sabem responder a isto ou vão dizer um simples “pois” antes de fazerem as 1500 perguntas banais que poderiam ter feito antes de perguntar se alguém quer ter filhos.

Se essas pessoas querem gabar-se dos filhos que têm, não precisam de perguntar aos casais (ou solteiros) se têm filhos antes de o fazerem. Fazem as perguntas banais. Depois disso, mostram as fotografias dos filhos e dizem tudo aquilo que pretendem dizer. Até porque, se alguém quer ter filhos e não consegue, seja por que motivo for, irá desabafar sobre isso mesmo com alguém. Se não é com quem insiste na pergunta, haverá um motivo forte para isso. E não irá ficar à espera de perguntas sobre o desejo de ter filhos para desabafar sobre o que quer que seja. Se for necessário, irá até procurar ajuda clínica para resolver o problema. Seja ele qual for.

Mais. Será que as pessoas que fazem a pergunta “então e filhos?” estão preparadas para respostas do género: “não quero ter filhos, odeio crianças.” Muitas pessoas podem pensar desta forma. Mas não querer ter filhos, mais uma vez algo que pode acontecer por diversos motivos, não significa que tenha de se andar a contar a toda a gente que não se quer ter filhos. Porque é uma coisa íntima do casal. Como muitas outras que ninguém ousa perguntar porque percebem que não o devem fazer.

Façam perguntas sobre o tempo. Sobre o Benfica, sobre os programas de televisão e até sobre as mais diversas fofoquices que estão na ordem do dia. Se não estão com um amigo há muito tempo, perguntem coisas sobre a carreira, sobre a vida e até sobre se ainda mantêm o relacionamento com a última pessoa que conheceram. Esqueçam lá isso de fazer perguntas sobre filhos. Porque, quando eles existem, as perguntas são desnecessárias. E, quando existe desejo mas ainda não existe criança, as pessoas dispensam falar sobre isso. Esta, é a minha forma de pensar.