28.8.13

poucos euros e acomodação profissional

Na semana passada escrevi um textosobre procura e oferta de emprego. Sobre as ofertas que são feitas aos diferentes tipos de pessoas que procuram emprego com valores a rondar os 600 euros. Na altura, surgiram vários comentários de pessoas licenciadas que acham pouco digno que se ofereça uma remuneração tão baixa a quem passou uma vida a estudar e que se especializou numa determinada área para se valer disso mesmo no momento da entrada no mercado profissional. Concordo com tudo isto, até porque já tive nesse lugar. Mas, aproveito agora para desenvolver um pouco mais este tema, que é bastante complexo.

Quando estava a estudar, mais especificamente na faculdade, acreditava que assim que concluísse o curso teria um emprego bem remunerado, dentro da minha área. E isto aconteceu por volta de 2002, altura em que iniciei o curso de comunicação social na universidade Lusófona. Acreditava nisto porque vinha de vários empregos onde até nem era mal pago e para os quais se exigiam poucas qualificações. Porém, cedo percebi que estava errado. Com o avançar do curso descobri que vagas na minha área eram muito poucas. E percebi também que isso dos ordenados “justos” era coisa para meia dúzia de alunos.

Depois de interiorizar isto que acabei de descrever ponderei sobre o que ia fazer quando o curso terminasse. E tinha dois caminhos a seguir: ficar à espera de um ordenado que considerasse justo tendo em conta os anos dedicados ao estudo bem como ao dinheiro utilizado no curso ou aceitar um estágio não remunerado na área e um emprego com um ordenado baixo, algo que seria suportado durante um período de tempo que considerasse aceitável e justo para mim. Como vivia na casa dos meus pais e não tinha contas para pagar, apostei na segunda hipótese.

Aceitei um estágio sem remuneração e durante seis meses estava disposto a pagar para trabalhar. Quando digo pagar para trabalhar refiro-me às despesas com deslocações. O objectivo que tinha em mente era apenas um: ser o melhor que pudesse ser, de modo a que a empresa reparasse em mim e não me deixasse ir embora. O meu esforço e empenho foi reconhecido a meio do estágio com um contrato. Na altura, aceitei sem hesitar o ordenado proposto. Olhando para o passado, percebo que podia ter exigido mais. Mas, para primeiro emprego na área achei que não era mau. Mais uma vez, vi-me numa estrada com dois caminhos a seguir: o da acomodação, em que passaria a minha vida a trabalhar a troco daquele valor ou ser melhor a cada dia, de modo a que a empresa entendesse que merecia mais do que aquilo que tinha. Escolhi a última opção. Que me trouxe ao patamar onde me encontro hoje, depois de ultrapassar várias barreiras. Se estou satisfeito? Não. Porque nunca estarei. Vou querer (e lutar por) sempre mais.

De forma resumida, esta é a minha história de vida na área em que me formei. Que não tem de ser vista como um exemplo. Porque cada qual pensa por si e toma as suas próprias decisões. Porém, aquilo que noto hoje em dia é que muitos jovens recém licenciados julgam que existem ordenados bons num primeiro emprego ao virar da esquina. Mas eles não existem. Existiam poucos na minha altura. E agora ainda existem menos. Se alguém disser que o mercado está bom, está a mentir. Porque isto está mau. Quer dizer... está uma grande merda. Esperar por um ordenado bom é uma aposta arriscada. Esta é a minha opinião. Também não defendo que todas as pessoas devam aceitar tudo. Existem contas a fazer. Perceber o projecto de que se vai fazer parte. As perspectivas de crescimento dentro da empresa e por aí fora. E depois, tomar uma decisão. Até porque pode ser melhor ganhar 800 euros num projecto certo e com pernas para andar do que 1200 num que vai morrer em poucos meses atirando a pessoa para o desemprego e com ordenados por pagar.

Além disto, noto também que muitas pessoas se acomodam em relação ao que têm. Pessoas que são capazes de passar uma década ou mais no mesmo cargo sem exigir uma única revisão salarial. “Estou bem assim”, “não me vou chatear com isso”, “já sei que me vão dizer que não”, são apenas alguns exemplos de coisas que dizem quando desafiados a procurar algo melhor ou a lutar por um ordenado digno e justo para aquilo que fazem. Porém, são pessoas que passam a vida a lamentar-se de nunca terem sido aumentados. Queixam-se mas nunca fizeram nada para estar melhor. Têm medo de concorrer a outros empregos ou de lutar por algo muito melhor no local onde estão.

Este é um tema que dá pano para mangas. Havia muito mais a dizer e passava horas de volta deste texto. Resumindo, defendo que toda a gente deve lutar por aquilo que considera ser justo para si e para as suas competências. Sem medo de ouvir um redondo não porque esse está sempre garantido. O que vier a mais é bónus. Agora, começar pelo topo e com ordenados chorudos é quase tão fácil como acertar na chave do euromilhões desta semana. Isso e ficar à espera que alguém nos pergunte se queremos um aumento salarial.

36 comentários:

  1. Concordo em absoluto. Infelizmente, em alguns casos, de nada adianta lutar por uma melhoria de salário, porque a entidade patronal só vê lucros e está, literalmente, a cagar para a prestação de cada um dos empregados. Neste caso, só resta lutar por um novo emprego... e onde é que eles estão? Uma pessoa acaba por se acomodar, involuntariamente, pois não tem opções.

    É muito complicado! É como tu dizes, este assunto tem pano para mangas, ainda havia tanto para dizer.

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    1. Mas cabe a cada um lutar por isso. Posso dizer-te que já estive em locais onde muitas pessoas diziam isso e consegui ser bem sucedido.

      Não é um caminho fácil mas a acomodação pode levar a situações muito chatas. Em que nos pisam e nós nada fazemos.

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    2. Tens razão, há que lutar sempre e evitar que nos pisem!

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  2. Concordo muito pouco com este texto porque as coisas não são tão lineares assim. O acomodar de que falas às vezes é mesmo por falta de oportunidades, ou sorte o que lhe queiram chamar :)

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    1. Existem esses casos mas acho que conheço mais pessoas com medo de arriscar e de pedir algo do que azarados ou com falta de oportunidades :)

      Mas não digo que estejas errada em certos casos.

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    2. Sim claro, também odeio generalizações e percebo bem o teu ponto de vista. salut! ;)

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  3. tb era como tu, ate vir a crise e colocar-me numa situaçao k nao desejo a ninguem. agora acomodei-me, ja tentei procurar algo melhor mas em vão. sei que nao dá por enquanto, melhores dias virão e aí sim irei novamente correr atrás.
    infelizmente hoje em dia nalgumas empresas kd pedes aumento devido ao teu bom empenho a resposta que levas é: o que nao falta aí é gente competente desempregada e disponivel pra receber salários baixos...

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    1. Mas o conselho que te dou é que nunca deixes de acreditar em ti. E nunca deves deixar de lutar por algo melhor. Mesmo que te digam não dez vezes.

      Conheço essa realidade de que falas mas o trabalhador tem de saber jogar com as armas que tem a seu favor.

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  4. Só agora, ao fim de 8 anos no mercado de trabalho, desde que terminei o meu curso, é que posso dizer que tenho um ordenado aceitável. Nunca optei pelo caminho fácil, optei sempre por fazer mais e melhor a cada dia, mesmo quando já não morava em casa dos pais e já tinha contas para pagar. Nunca quis começar pelo topo, pelo contrário. Se estou onde estou hoje em dia, se cheguei onde cheguei, foi graças ao meu trabalho, esforço e empenho (modéstia à parte). A cada salto ou etapa da minha carreira profissional fui recebendo (€ entenda-se) um bocadinho mais, mas a diferença era muito pouca. Na minha penúltima etapa, há 3 anos atrás, quando mudei de área, sofreu um ligeiro recuo. Muitos no meu lugar teriam dado um murro na mesa, mas achei que para dar 5 passos à frente precisava de dar um atrás, até porque estava a mudar de área. Até que chegou ao dia em que melhorou um pouco. Mesmo tenho passado a recibos verdes, em que os descontos são muitos, estava um pouco a cima do que ganhei no meu primeiro emprego, uma diferença de 100€).
    Em Janeiro deste ano fiquei desempregada, cortes de custos e pessoal. A crise pregou-me uma valente rasteira. No seu post anterior comentei as propostas ridículas que me fizeram ao longo dos 5 meses em que estive desempregada, 500€ a recibos verdes, estágios, etc. Neste momento já tenho contas para pagar e estes 5 meses não foram fáceis, pois como estava a recibos verdes não tinha direito a subsídio de desemprego. Mas o pontapé da crise levou-me mais longe, e neste momento estou a trabalhar na minha área, não tive de sair do país, e estou a ganhar aquilo que poderia estar a ganhar há 2 anos se não estivesse a recibos verdes. Quem luta e quem trabalha sempre alcança. Todo o bom trabalho é recompensado!

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    1. Acho que és um belo exemplo da minha forma de pensar e agradeço imenso o teu testemunho aqui. Muito obrigado, tal como já tinhas feito da outra vez.

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    2. Mas sair do pais 'e uma ma opcao? Porque ja agora? Os ordenados sao uma anedota, o ambiente de trabalho 'e pessimo, e as hipoteses de progressao dentro de uma estrutura normalmente sao determinados pelos apelidos. Isto 'e apenas a realidade. Portugal 'e um otimo pais para passar ferias, mas para trabalhar 'e para esquecer.

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    3. Não estou a dizer que é uma má opção sair do país. Desde que soube que ia ficar desempregada comecei à procura de trabalho lá fora, mas na minha área não é fácil, embora ainda seja um pouco mais fácil que cá. Tinha posto uma meta a mim mesma. Se até Agosto não tivesse arranjado nada iria de armas e bagagens lá para fora. Mas isso não foi preciso, pois arranjei trabalho cá. Se não lutei por um trabalho lá fora como lutei por um cá, foi por opção, porque não queria largar tudo o que tinha aqui: cortar laços custa bastante, o preço a pagar é bastante caro, pelo menos para mim, claro.

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    4. Este é um tema que dá muito que falar.

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  5. De nada :) Só espero que inspire as pessoas a lutarem por aquilo que querem. Algumas oportunidades vêm ter connosco, sim, mas também é preciso saber criá-las e fazê-las acontecer. De braços cruzados é que elas não acontecem!

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  6. Acabei de terminar um Mestrado na área da Educação e apesar de saber que é uma área super complicada de entrar não penso desistir. Já vi ofertas de trabalho que são péssimas mas existem outras aceitáveis. E neste momento da minha vida o que me interessa é começar, ganhar experiência. Porque na verdade os "bons" trabalhos requerem experiência. E é nisso que nos temos que focar quando saímos do ensino superior.

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  7. Tens toda a razão.
    Eu fiz um percurso semelhante. Trabalhei sempre durante o curso e cada vez fui conseguindo ganhar um pouco mais e fazer o que realmente queria. Não fiquei à espera. Houve quem ficasse e não arranjou nada de jeito. Eu fui ganhando experiência e mudando para melhor.
    vidademulheraos40.blogspot.com.

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  8. A vida é feita de escolhas e há sempre alternativas, formas de mudar...Como dizes tu, e muito bem, cabe a cada um escolher/decidir o caminho a seguir e é aí que surgem as diferentes perspectivas...
    Como a minha avó dizia, a única coisa que não se pode mudar é a morte.

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  9. É a lei da oferta e da procura... nada mais simples. Se a procura for superior à oferta os salários sobem, caso contrário baixam. Lamentavelmente, neste momento, a tendência é de descida dos salários devidos à destruição do emprego...
    Devemos, de qualquer modo, procurar sempre uma evolução das nossas carreiras... mas tal escolha cabe a cada um. Uns serão amantes do risco, mais aventureiros na busca de melhores condições e salários, outros, aversos ao risco... tal é a natureza humana.

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    1. Por isso é que isto é um tema tão interessante. Mas custa-me ver pessoas com talento a parar no tempo. Por mais que se puxe por elas.

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  10. Não sou licenciada e nem por isso a vida me impediu de ter um belo ordenado até há dois anos atrás, quando por fruto da crise, fui incluida no processo de despedimento colectivo e fiquei sem trabalho. Recusei-me a trabalhar por turnos inicialmente e aceite um trabalho a ganhar METADE do anterior vencimento, gastando desse outra metade sópara ir trabalhar. Decidi despedir-me com data de 15 de agosto e entretanto fui enviando c.v. para tudo e mais alguma coisa (tenho contas para pagar e gosto de me manter activa), no dia 16 agosto fui chamada para uma entrevista e comecei dia 17, trabalhei o meu primeiro Domingo em 19 anos de trabalho, saí uma semana inteira às 23:15h, ao final de uma semana estavam a trocar-me de secção (acto que só concretizam a quem esteja pelo menos há seis meses na empresa) e continuo a mostrar quem sou pelo que dou de mim. E aposto que não paro por aqui....e a ganhar um pouco mais. Estive desempregada 1 dia. Acredito que o conhecimento adquirido é algo que vale dinheiro e eve-se cobrar por isso mas não acho minimamente degradante começar por baixo, seja em que altura da vida. Começar algo é sempre bom, muito melhor do que ficar parado. É apenas a minha opinião, portanto concordo com tudo o que li neste post.

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  11. Concordo. Como diz o ditado: "Mais vale um pássaro na mão do que dois a voar". Mais vale pouco do que nada. Mas há que ter ambição na vida para não estagnarmos num emprego do qual não gostamos. Eu sou apologista de que se deve lutar sempre para se fazer o que se gosta. No meu caso, tenho um currículo repleto de várias situações que não interessam para nada, mas se não fosse isso não conseguiria sobreviver e pagar contas ao final do mês. Além disso, tenho um curso na área da Saúde e nunca consegui colocação. Por isso tenho lutado por aquilo em que acredito mesmo nas situações mais difíceis. Neste momento trabalho na PT para me conseguir organizar e estabilizar financeiramente mas levo a escrita ( a minha real vocação) sempre a reboque da minha força de vontade. Enfim... Isto está fácil? De maneira nenhuma. Mas não é hora de baixar os braços. Pelo contrário! É preciso lutar sempre, com crise ou sem ela.

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  12. Estás agora a falar de coisas diferentes.

    Um patrão que oferece 600 euros a recibos verdes a um recém-licenciado não está interessado em aumentar-lhe a remuneração.

    No meu caso, recém-licenciada, considero que recebo um ordenado bastante justo (se olhar para o ordenado bruto... que o Estado leva-me boa parte todos os meses), considerando as horas de trabalho que se estendem, e sei que tenho a possibilidade de crescer dentro da empresa se for boa no que faço.

    Agora não conheço nenhum patrão que sugira um trabalho de 600euros a recibos verdes que tenha acabado a dar boas condições aos empregados (btw, a fiscalização em relação aos falsos recibos verdes vai mudar em Setembro)

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    1. Inês, o valor foi só para situar este texto em relação ao anterior. Aqui, falo das oportunidades e de pessoas que acham que só devem trabalhar com um certo valor, que actualmente existe em muitos poucos cargos.

      Espero que cresças e acho que tens a atitude certa.

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  13. Concordo contigo. Comecei por baixo pensando que depois seria recompensada. Mais do que tentar um aumento salarial tentei que actualizassem a categoria profissional onde estava inserida, porque comecei por um trabalho e depois passei a fazer outro. Falei no assunto diversas vezes, explicando que o que estavam a fazer era além de injusto, ilegal. A única coisa que não fiz foi fazer queixa ao ACT porque achei que se o fizesse me mandavam embora. Pensei que se me calasse mais algum tempo me recompensariam. Ao fim de 6 anos despediram-me. Fiz isso tudo o que disseste e em que sempre acreditei, lutei sempre, mostrei sempre o meu valor, fiz o meu trabalho o melhor que pude, fiz mais do que devia ter feito, e agora estou no desemprego. Voltei à estaca zero. E agora? Continuo a concordar contigo e a acreditar no que disseste, mas tudo depende de quem encontras do outro lado. E eu tive muito azar. Perdi 6 anos da minha vida numa empresa. E neste momento entrar novamente no mercado de trabalho, na minha área, é quase impossível, a não ser que aceite um part-time a recibos verdes em que metade do ordenado vai para a segurança social e a outra metade para as deslocações. O que fazer? Não sei.
    Beijinho

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    1. Espero que não desistas. Do que vou lendo teu por aqui pareces uma pessoa de bons valores e com força de vontade. Não mudes isso e aproveita isso mesmo nesta fase da tua vida.

      Em relação ao ACT, acho que as denúncias podem ser anónimas, algo que protege os trabalhadores de situações com as que referiste.

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    2. Podem ser anónimas, mas infelizmente na maioria dos casos esse anonimato deixa de o ser. E não me perguntes como. :/

      Não quero desistir, não. Não sei ser de outra forma, por isso não hei-de mudar. :) Obrigada pela força.

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    3. Mas não deveria.

      Eu acredito em ti :)

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  14. Temos uma história parecida, quando terminei o curso tive logo uma proposta de emprego na minha área (Turismo)era práticamente o andar a pagar para ir trabalhar, mas o que é certo é que ganhei experiência e curriculum o que me permitiu ter novas propostas de trabalho, e sempre que tinha uma nova proposta a ganhar mais ia sempre mudando, hoje em dia infelizmente o mercado já não permite, mas não me arrependo nada dos sitios por onde passei,fiquei mais rica a nível profissional e pessoal que também é bastante importante.

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