19.6.17

o dia em que quase perdi o meu melhor amigo (por causa de uma mulher)

Gosto de acreditar que todas as pessoas tendem a olhar para si enquanto heróis dos melhores amigos. Gosto de acreditar que todas as pessoas já viveram um momento que terminou com um amigo a olhar para si enquanto herói. "És o meu herói", diz o amigo. Eu tenho uma história dessas. Pelo menos aos meus olhos. Mas a verdade é que essa história quase que me custou a amizade de um dos meus melhores amigos. A história que vou contar envolve esse meu amigo e uma mulher. Apesar de adorar esta história, nunca a contei aqui. Mas antes de falar do que aconteceu numa determinada noite, vou falar sobre este meu amigo de quem gosto muito.

A vida é feita de coincidências. E este amigo chegou à minha vida numa delas. Conheci o Cachucho através de um amigo com quem trabalhei. E foi chegar, ver e vencer. Desde esse dia que o Cachucho está na minha vida. Mais tarde chegou o seu irmão mais velho. Duas das pessoas de quem mais gosto. E que dão sentido à amizade, relação que anda pelas ruas da amargura. Tenho uma relação bastante peculiar com este meu amigo. Ligo-lhe perto de outras pessoas e solicito vaga para uma massagem erótica, antes de me despedir com beijos. O que faz com que as pessoas pensem que estou a falar com uma mulher e fiquem a olhar para mim com desconfiança.

Além disso gosto de lhe chamar nomes como p***. Algo que já originou um episódio que envolve redes sociais. Chamar p*** a um amigo não tem nada de mal. Mesmo quando o insulto (neste caso mimo) é feito através de whatsapp. O risco é quando tens, na lista de contactos um Cachucho e um Capucho. Que por acaso é uma antiga glória do Futebol Clube do Porto. O risco é ainda maior quando envias a mensagem à pressa, cheio de confiança. "Então minha p***, como é?", foi aquilo que escrevi. Os minutos foram passando e não tinha resposta. O que é estranho quando se trata deste amigo. Até que o telefone toca. Abro a mensagem e leio: "quem é?". Por breves instantes ainda pensei que fosse o meu amigo a gozar comigo. Na realidade era o Capucho a perguntar quem era a pessoa. Tudo ficou resolvido, sobretudo no que à vergonha diz respeito, com um "é engano". Agradecendo o facto de ter o número do Capucho e ele não ter o meu. Mas não é desta história que quero falar. É do que aí vem agora...

No blogue já dei conta da existência das festas da lua cheia. Que ocorrem no Verão, em noite de lua cheia, na praia do Xiringuito, em Albufeira, no Algarve. A única vez que estive numa destas festas (não sei se ainda existem) foi com o Cachucho. A caminho da festa um carro veio fora de mão na nossa direcção. O que por si só já valia uma história. Mas lá fomos nós. A chegada à praia é algo mágico. A praia só está iluminada por candeeiros de papel. Espalhados pelo pequeno areal e alguns na água. A festa, mesmo "secreta" e numa praia discreta, atrai muita gente. E naquela noite não foi excepção. Não me recordo da música que ouvi. Nem do que bebi. Lembro-me de que estava cheia de gente e do que se segue.

A caminho da manhã, quando muitas pessoas já beberam um pouco mais, estivemos à conversa com um senhor que tinha uma profissão interessante. Aquele homem realizada os sonhos das pessoas. Melhor, dava-lhes vida. Se alguém dizia que gostava de ir pescar amanhã num determinado destino, ele tratava de tudo. Apresentava o preço e lá ia o cliente feliz. Foi no final da conversa com este homem que quase perdi a amizade que me liga a um dos meus melhores amigos. E tudo por causa de uma mulher. A conversa com aquele homem decorreu perto das casas-de-banho. E por sua vez perto do bar. Pois quem já lá esteve (e isto passou-se há alguns anos) sabe que o espaço é pequeno.

Lá estávamos nós quando uma senhora se aproxima pelas minhas costas. A senhora queria saber onde era a casa-de-banho. Que era mesmo ao nosso lado. Mas o meu amigo fez questão de acompanhar a senhora à casa-de-banho. Um pouco de álcool a mais transforma qualquer pessoa numa pessoa simpática e prestável. Recordo-me que se gerou uma confusão com as casas-de-banho. Porque a mulher estava a andar para a errada. "Essa casa-de-banho é dos homens. A outra é que é a das senhoras", disse-lhe. E a mulher em questão diz: "mas a casa-de-banho pode ser multi sexo", puxando-o para que fosse para a casa-de-banho com ela.

Foi aí que surgiu o meu momento herói. Agarrei o meu amigo pelo braço, puxei-o e disse: "Não vais a lado nenhum". Ele ainda insistiu. Que queria ir e tal. Num misto de herói com pai, não o larguei até ter a certeza de que não ia para a casa-de-banho com aquela mulher. Com quem acabaria por ter uma relação sexual fugaz. Além de não o deixar ir, expliquei os motivos. Disse-lhe que a senhora estava muito bêbada. Que tinha idade para quase ser avó dele. E que deveria ter meia dúzia de dentes na boca. Tudo detalhes que não me escaparam. E que ele ignorou. Porque para ele era a Sharon Stone que o estava a desafiar para uma aventura na casa-de-banho.

Costuma dizer-se que todas as histórias têm três versões. Uma de cada pessoa e a verdade. A minha versão, aquela que faz de mim o herói do meu melhor amigo, é a que contei. A do meu amigo é que não o deixei ter um caso com a Sharon Stone. E existe a verdade. Que é a minha versão. Já perdi conta ao número de vezes que nos rimos com esta história. O número de vezes que foi partilhada com amigos nossos. Que acreditam mais em mim do que nele. O que dá mais força à minha versão. Apesar de continuar a dizer que não o deixei viver a aventura da sua vida. Isto de ser herói representa um risco. Mas hoje voltaria a fazer o mesmo. E tenho a certeza de que a única semelhança que aquela mulher poderá ter com a Sharon Stone será o nome. Nada mais do que isso.

Adoro esta história. Adoro a noite em que aconteceu e como aconteceu. Especialmente por ser com este amigo de quem gosto tanto. Apesar de gostar tanto desta aventura - em que continuo a acreditar ser o herói - nunca tinha falado dela aqui. Mas aceitei o desafio do Festival Grant's Stand Together e contei a minha história. Uma daquelas que irei recordar para sempre. Estas histórias desconhecidas são um dos motivos pelos quais gosto tanto deste festival. Que vai decorrer no Cinema São Jorge, em Lisboa, nos dias 23 e 24 de junho. E na Fundação de Serralves, no Porto, nos dias 1 e 2 de julho. E onde voltarei a ir.

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