Ontem, ao fazer zapping deparei-me com uma reportagem da Record sobre acompanhantes de luxo brasileiras, algumas com vidas duplas. A maioria das mulheres dava a cara. Apenas uma, que durante o dia era dentista, não mostrou a cara para não ser reconhecida. Também falou um cliente habitual deste tipo de serviço e psicólogos. Entre aquelas mulheres existiam algumas que eram mães.
Nunca tive dúvidas de que se trata de uma profissão muito bem remunerada. E isso ficou provado na reportagem. Em média ganhavam qualquer coisa como 14400 euros por mês. Sendo que podiam existir meses com uma remuneração de 20 mil euros ou mesmo 29 mil euros. Algumas das mulheres não tinham problemas em assumir que vendiam o corpo. Outra preferia dizer que alugava. Dizia que existiam pessoas que davam o seu de graça enquanto ela preferia alugar o dela.
Existia o caso particular de uma mulher que tinha no marido o seu "empresário", como dizia. Que não trabalhava para ficar em casa a gerir o seu dinheiro. Homem esse para quem era perfeitamente natural a mulher ganhar dinheiro a prostituir-se. É normal agora pois confessou que teve uma discussão com ela, partiu-lhe o telemóvel e até lutaram quando soube que a mulher era acompanhante. Agora tudo está bem porque o dinheiro é que importa, dizia.
A ideia com que fiquei é que para algumas mulheres a prostituição era vista como o caminho mais fácil para o luxo. E fiquei com esta ideia porque se gabaram diversas vezes que assim podiam comprar a carteira xpto de cinco mil euros, que podiam beber os vinhos mais caros e que podiam frequentar os sítios mais badalados. Este era o tema de conversa de algumas mulheres. Todas tinham em comum o cuidado com a aparência. Como tal, parte do vencimento era destinado a tratamentos de beleza. Num dos casos a mulher gastava uma boa parte do dinheiro que ganhava em tratamentos e em artigos de luxo.
Algumas mulheres transmitiram a ideia de que viviam ao estilo de "chapa ganha, chapa gasta". Compravam tudo o que queriam sem olhar a preços. Depois, existia uma mulher que já tinha comprado cinco apartamentos com o dinheiro ganho na prostituição. Apartamentos que arrendava. E de todas, existia uma que queria deixar aquela vida no próximo ano de modo a construir aquilo que nunca teve: uma família.
Os psicólogos partilharam diversas opiniões mas aquela que mais prendeu a minha atenção foi partilhada por uma das acompanhantes. Segundo esta, todas as mulheres que acabam na prostituição têm famílias disfuncionais e problemáticas. Um modo de pensar partilhado pelo psicólogo. E que entendo fazer algum sentido. Isto porque acredito que a prostituição acaba por ser, nem que seja numa fase inicial, o espace de algo. A solução de um qualquer problema que surgiu e que parece não ter solução aparente.
Existiram alguns momentos da reportagem que tiveram um maior impacto em mim. A começar, e isto é algo pessoal, não fiquei agradado que acompanhantes de luxo que eram mães de crianças perto dos dez anos dessem a cara na reportagem. Nada tenho contra as mulheres que fazem do sexo a sua vida mas acho que ao dar a cara estão também a expor as crianças. Essas mulheres vão ser reconhecidas e essa exposição, que não será prejudicial para elas, poderá afectar e marcar as crianças. E é nesse sentido que entendo que não deveriam dar a cara.
Arrepiei-me quando uma acompanhante que tinha fugido de casa porque o companheiro da mãe abusou sexualmente de si durante três anos (começou quando tinha dez) com o conhecimento da mãe. Este é apenas um dado assustador da vida desta mulher que também foi abandonada pelo pai da sua filha. Esta acompanhante confessou que quando se iniciou na prostituição trabalhava numa casa que cobrava 30 reais por vinte minutos. Deste valor ficava apenas com 15 reais, algo como pouco mais de quatro euros. Esta mulher dizia que chegava a atender 40 homens por dia de modo a ter um ordenado decente. Arrepiou-me também quando disse que não gostava que os clientes lhe fizessem festinhas nem que tivesse toques leves em si porque isso lembrava a altura em que tinha sido abusada sexualmente. Esta era a mulher que estava determinada a abandonar esta vida para ser feliz e criar uma família. A família que nunca teve pois não sabia quem era o seu pai e a mãe passava a vida a bater-lhe.
Houve também uma acompanhante que disse que já se tinha apaixonado por um cliente mas que o seu foco foi sempre o dinheiro. Aliás, não teve problemas em dizer que valorizava mais o dinheiro do que ter uma pessoa do seu lado. Porque assim podia comprar tudo o que queria. Era uma mulher que valorizava o luxo.
Outro momento que me marcou foi aquele que considero mais polémico na reportagem. Uma acompanhante que tinha, creio, diversos filhos explicou o que faria caso a filha lhe dissesse que pretendia ser acompanhante de luxo. A mulher não hesitou e disse logo que a ensinava a ser a melhor acompanhante de luxo. Que lhe dava um manual com tudo aquilo que deveria fazer para chegar onde a mãe chegou. A mulher sabia que estava a ser polémica mas não tentaria demover a filha. Tendo em conta que aquelas mulheres acabaram na prostituição como solução para algo, julgo que não seja normal que uma mãe não tente demover uma filha que tenha esta ideia. Por outro lado, esta será a realidade que a criança conhece. Será a realidade "normal" que conhece. O psicólogo defendia que o risco desta criança vir a ter problemas com esta realidade era muito maior do que o eventual luxo com que possa viver.
Esta reportagem (Repórter Record Investigação) demorou dois meses a ser feita, foi exibida ontem e pode ser revista. Recomendo porque está bem feita e mostra mais detalhes da realidade diária das acompanhantes/prostitutas. Ajudará a destruir alguns preconceitos. Levantará algumas questões. Dará que pensar em muitos momentos. E será polémica do início ao fim.
Por acaso também essa reportagem. É uma vida de ilusão para quem ouve à primeira, mas nas realidade não é bem isso.
ResponderEliminarO luxo é apenas uma das facetas. E que "esconde" muita coisa.
EliminarDesde que a mulher seja acompanhante de boa vontade não vejo problema nisso.. Vendem o que é seu, e não magoam ninguém.Pena que as pessoas sejam tão moralistas por uma coisa que todos fazem: sexo.
ResponderEliminarEu até acho que devia ser uma profissão reconhecida, com descontos, direito a sistema de saúde, inspeções médicas e tal.
Não tenho problema nenhum com esta profissão. Mas a reportagem é boa para quebrar muitas barreiras e dar a conhecer uma realidade que muitas pessoas desconhecem.
EliminarÉ sem dúvida uma realidade que todos nós sabemos que existe, mas que acaba por nos passar totalmente ao lado. Só de ler o teu texto, já me deu arrepios, não só da acompanhante que foi abusada, como da outra que se prontifica a ajudar a filha a ser como ela. Isto tudo por causa do dinheiro.
ResponderEliminarA reportagem tem momentos de grande impacto. A história do abuso e a forma como descreve é de arrepiar.
EliminarNão acredito que se opte pela prostituicao como forma de estar na vida. " o que queres ser quando fores grande? Eu quero ser prostituta". Acredito que todas as mulheres que escolhem este caminho vem de famílias disfuncionais, muitas vezes vítimas de abusos físicos, sexuais, emocionais. Foram pais ou mães que não souberam amar, respeitar, sem competências parentais, modelos de referencia destruturados e que nunca deveriam ter tido filhos. Crianças que não foram amadas não podem ser adultos saudáveis emocionalmente e com amor próprio e respeito por si próprias. Sara Guelha
ResponderEliminarUma das acompanhantes diz isso. Diz que é o seu caso e que acredita que todas as mulheres que escolhem aquele caminho é por causa de problemas familiares. E acho que faz sentido numa fase inicial. Depois entram outros factores como dinheiro fácil, luxo e outras coisas.
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