o humor morreu

Dizer que o humor morreu é capaz de ser um exagero. O mais justo seria dizer que perdeu uma fatia importante e de grande relevo ao longo dos últimos dezasseis anos. Esta provavelmente seria a forma mais honesta de falar sobre o adeus de Jon Stewart que abandou o programa Daily Show depois de mais de duas mil emissões ao longo de pouco mais de década e meia. Se o humor fosse uma arte em que poucos se aventuram e onde só os predestinados têm lugar o adeus de Jon Stewart seria irrelevante.

Mas esta não é a realidade. Sobretudo em Portugal. Onde em cada "esquina" temos alguém que se vê como uma espécie de humorista incompreendido. Onde em cada "esquina" temos alguém que se intitula de rei ou rainha do sarcasmo. Será que a maior parte das pessoas sabem sequer o significado de sarcasmo? Actualmente todos são humoristas. Todos entendem que podem gozar com todas as pessoas porque isso é humor. Mesmo que não passe de deselegância, falta de classe e de um extremo mau gosto. Mas ninguém consegue convencer estes "comediantes" de algibeira de que não têm piada. E de que não fazem humor. Porque entendem que fazem e que os outros é que não conseguem perceber as suas piadas e o seu sarcasmo.

Para os "comediantes" de algibeira tudo é possível. Não brincam, gozam com as pessoas e sempre com mau gosto, algo que aos seus olhos é humor refinado. Vale tudo para receber mais um "aplauso". É mais ou menos como aqueles adoráveis macaquinhos do Jardim Zoológico de Lisboa que estão sempre disponíveis a algo mais para receber mais uns quantos amendoins. É mais ou menos isto mas em mau. Porque a situação dos animais até tem a sua piada. Algo que os "comediantes" não conseguem ter. Excepto para a meia dúzia de pessoas que os vão alimentando com "amendoins".

Existe uma linha muito ténue que separa a classe do mau gosto. E um bom comediante consegue andar nesta linha de olhos fechados e até completamente embriagado que nunca irá cair para o lado do mau gosto. Estará sempre equilibrado. E era isso que Jon Stewart fazia na perfeição. E é por isso que o seu adeus teve um impacto gigante. Não se trata de uma pessoa qualquer que abandona o seu local de trabalho. É uma facada no humor. E na forma ligeira de lidar com a (nem sempre simpática) realidade mundial.

E a prova de que é possível fazer humor de qualidade sem perder a classe é que muitos dos alvos satíricos de Jon Stewart recorreram às redes sociais para se despedir de alguém que brincou ou gozou consigo ao longo de anos. Ontem via a CNN e deparei-me com um jornalista que dava destaque à última emissão do programa (com Jon pois segue-se Trevor Noah que terá uma gigantesca e pesada herança) e que mostrava um vídeo em que Jon Stewart brincou consigo. E ria a bom rir com a piada que era sobre si. Depois foi mostrado um adeus, em forma de vídeo, da Arby´s, uma cadeia de fast food bastante atacada pelo comediante. E o CEO da Arby´s elogiou Jon Stewart.

Que os "comediantes" de algibeira e os auto-intitulados reis e rainhas do sarcasmo estudem a carreira de Jon Stewart à frente do Daily Show. Aprendam a diferença entre gozar sem piada e sem classe a troco de meia dúzia de aplausos e brincar, gozar ou satirizar provocando um sorriso nos alvos das suas piadas. #JonVoyage num dia triste para o humor mundial.