31.1.17

o glamour nem sempre é o que parece

O jornalismo em Portugal está a viver um dos piores momentos de sempre. Quem está atento à área saberá a quantidade de publicações que estão a fechar. Os despedimentos que existem. Os cortes aqui e ali. E praticamente nenhuma publicação escapa a estes “ajustes”. O que faz com que qualquer jornalista, pelo menos a maioria, não saiba como será o dia de amanhã.

Existem publicações, que por estarem associadas a figuras públicas, acabam por ter um impacto maior junto do público. Cristina a revista da apresentadora Cristina Ferreira é capaz de ser o melhor exemplo do que pretendo dizer. A sua revista faz com que muitas pessoas olhem para o jornalismo como um grande sucesso, cheio de glamour e coisas boas. Mas o glamour nem sempre é real.

Não está em causa a qualidade do produto. Mas a verdade é que a revista vai fechar, saindo apenas mais uma edição. E todas as pessoas olhavam para este projecto como uma espécie de galinha dos ovos de ouro das publicações. Mas nem com o selo de qualidade de Cristina Ferreira o projecto se manteve. E as vendas, que chegaram a ser de 110 mil euros desceram, em algumas edições para os 32 mil exemplares por edição.

Este é apenas mais um exemplo do que está a acontecer. E tenho a certeza de que os fechos não ficam por aqui. Vão existir mais publicações a fechar portas. Algumas vão tentar dar lugar a sites mas não sei se a solução está aí. O que sei é que neste momento o jornalismo está a uma grande distância daquilo que era quando dei entrada nesta área. E aquilo que as pessoas (ainda) não sabem é que o jornalismo perdeu a maioria do glamour que lhe é atribuído.

Se continua a ser uma profissão apaixonante? Claro que sim! Se faz falta às pessoas? Claro que sim. Mas as pessoas só vão perceber a falta que faz o jornalismo quando ele for praticamente inexistente. Quando a informação estiver canalizada para meia dúzia de sítios que facilmente são controlados e que não aquecem nem arrefecem. Aí é que as pessoas vão perceber a falta que o jornalismo faz.

Até chegar esse momento, as pessoas vão continuar a acreditar que o jornalismo é um mundo de glamour pago a peso de ouro. Onde todos ganham fortunas e têm direito e isto e aquilo. Quando a realidade mostra um número cada vez maior de despedimentos, de estagiários, de pessoas com ordenados muito baixos que até têm vergonha de o dizer e, apenas para dar mais um exemplo, de jornalistas que ganham migalhas por cada clique que uma notícia que escrevem é publicada neste ou naquele site.

4 comentários:

  1. Olá :)
    Do ponto de vista humano lamento que a tua área esteja ( e já há muito tempo) a passar por grandes dificuldades. É terrível nesta perspectiva, para quem é capaz de empatia, saber de qualquer pessoa(s)que esteja a lidar com incertezas e dificuldades.
    Contudo, tenho que admitir que acredito que seja um sector que tenha que se actualizar, que se redefinir, que voltar a apostar na qualidade, que voltar à raíz do jornalismo (em bom). Como consumidora sinto que houve um decréscimo bastante acentuado na qualidade do que chega às bancas: os jornais parecem mais sensacionalistas, em toda a imprensa apanham-se conteúdos, (não digo que sejam todos, atenção; sempre há e sempre houve bom e mau jornalismo), que são fruto não de investigação cuidada, mas que parece ter sido um copy paste de um facebook, etc. Os resultados reflectem muita coisa, desde o feedback do consumidor à qualidade do produto, até às tendências do tempo em que vivemos, em que muito do que se apresenta em formato papel já deveria ter passado para o digital, o número de concorrentes no mercado, as próprias tendências de consumo, etc...
    A tua área está a passar pelo mesmo dilema que afecta mil outras áreas ao longo dos ciclos que se vão repetindo pelos tempos.
    Ainda há pouco li sobre um jornal japonês que é feito de papel reciclado, usa tinta vegetal e sementes na sua composição, e as pessoas adoram o facto de o poderem reciclar, simplesmente cobrindo-o de terra e ver flores a desabrochar no espaço de dias.
    O futuro do jornalismo e da imprensa daria um óptimo tema de reflexão conjunta, quem sabe em forma de conferência?

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    1. Tens razão no que dizes. Mas o jornalismo é o reflexo do consumo das pessoas. Já reparaste que os noticiários na televisão têm cada vez mais notícias "cor-de-rosa" apesar de gostarem de passar a imagem de que não estão a fazer o mesmo.

      O jornalismo, como tudo o resto, alimenta as pessoas com aquilo que elas querem comer. O que se passa é que hoje todas as pessoas têm acesso aos conteúdos sem precisar de comprar o que quer que seja. Há menos pessoas a comprar jornais e revistas.

      Dava mesmo um óptimo tema.

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  2. Olá :)
    Já reparei na tendência televisiva que abordas, e tens toda a razão.
    Quanto ao que dizes, fizeste-me lembrar o director de programação que fez parte de um painel de conferências que assisti há uns bons anos. Naquele ponto debatia-se um pouco o papel dos media na educação vs isso de dar ao público o que ele quer comer. Que as pessoas escolhem o querem ver, e há que acompanhar as tendências, etc, que as regras do sucesso assim o ditam, etc. Eu afirmava que a premissa base desse conceito não é totalmente verídico: embora exista variedade de conteúdos, estes não são infinitos e o que chega ao público nasce, quer em tv, rádio ou imprensa, dos decisores e executores nos próprios meios de comunicação, portanto são estes os grandes ditadores de tendências. Por exemplo, se não fossem os canais de tv começarem com masterchef e afins, se calhar nunca teria existido este boom de interesse global em redor da culinária, o Cesar Millan e o treino canino é outro exemplo.
    Eu defendo que as pessoas escolhem daquilo que lhes é dado, e que não há desculpas para a irresponsabilidade qualitativa dos conteúdos.
    Quanto às condições laborais, isso é outra história: todo o ser humano merece o respeito de ter condições condignas.

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    1. Existe essa tendência porque chega de fora. Não vês na televisão, vês na net. E se é um sucesso na net, as televisões acompanham, comprando o produto. As televisões são o reflexo do que as pessoas querem ver. E, por mais duro que isto possa soar, não vão gastar milhões a instruir os telespectadores quando estes são alimentados com aquilo que querem ver noutro canal.

      Os únicos canais que se podem dar a este luxo são aqueles que vivem com dinheiros do Estado e que não estão presos a audiências. Os outros vivem dos resultados, como qualquer empresa.

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