7.1.16

não cores bebé vs estava a admirar-te

No último post partilhei dois vídeos. Um tem como protagonista um homem, Chris Gayle, e é mais recente. O outro uma mulher, Maria Sharapova, e é mais antigo (de 2014). Nos vídeos entram ainda (no segundo apenas a voz) dois jornalistas: no primeiro uma mulher e no segundo um homem. Existe ainda mais um ponto em comum entre os vídeos pois Chris Gayle e Maria Sharapova são atletas profissionais.

Vou começar pelo vídeo mais recente. O cricket é uma modalidade desportiva que pouco ou nada diz à generalidade dos portugueses. Mas o jamaicano Chris Gayle é um dos atletas mais mediáticos mundialmente. Num dos últimos jogos o atleta foi o escolhido para ir à flash interview onde estava a jornalista Mel McLaughlin. E tudo descambou quando o atleta elogiou os olhos da jornalista em directo na televisão australiana. Ainda a convidou para beber um copo e concluiu com um “não cores bebé”. No vídeo que partilhei é evidente o desconforto da jornalista.

Agora o segundo vídeo. Trata-se de uma conferência de Maria Sharapova após ter sido eliminada do Open da Austrália, em 2014. O jornalista Lachlan Wills fez a pergunta que queria fazer. “Tens tanta autoestima quando falas. É muito bom. Qual foi mesmo a pergunta? Estava a admirar-te”, disse a tenista russa. Contrariamente ao que acontece com Mel McLaughlin, Lachlan Wills não fica sem jeito. Responde a todas as “provocações” da tenista.

Voltando à primeira história. Chris Gayle foi acusado de assédio sexual e multado em aproximadamente nove mil euros. O jogador, que tem fama de mulherengo e polémico, já pediu desculpa à jornalista que aceitou o pedido e revelou sentir-se desconfortável por ser o centro da história. Chris Gayle foi ainda atacado nas redes sociais sendo visto como uma pessoa mal educada e parva. Quanto ao vídeo mais antigo, Maria Sharapova não foi acusada de nada.

Numa altura em que os piropos estão na ordem do dia, quais as diferenças entre estes dois momentos em que atletas profissionais entram num jogo de flirt com jornalistas? No primeiro caso existe um elogio aos olhos e o desejo de beber um copo com a pessoa. No outro um elogio e a confissão de não ouvir uma pergunta porque está a admirar a pessoa que a fez. Chris Gayle foi atacado. Maria Sharapova não.

Olhando para a situação em si considero que tanto Gayle como Sharapova excederam-se. Ambos foram autores de comentários inapropriados para o local. Não ignoro que o jogador de cricket foi mais directo revelando a esperança de beber um copo com a jornalista. Mas o conteúdo em si é igual. A grande diferença está na reacção dos jornalistas. A mulher ficou claramente incomodada enquanto o homem, embora não exista imagem, reage de pronto às palavras de Sharapova.

Mas a análise destes dois casos é completamente diferente. Gayle foi atacado pelo que fez. E Sharapova, por algo semelhante, não. E levantou-se a questão se não será a diferença entre homem e mulher que está a gerar tanta polémica. Quando escrevi sobre os piropos (texto aqui) revelei que ainda existe diferença na forma como as pessoas olham para situações idênticas mas com protagonistas de diferentes sexos. E estes dois vídeos ajudam a exemplificar o que pretendi dizer na altura. A jornalista é uma vítima (e na realidade é pois a situação é absurda e inapropriada) mas o jornalista não foi visto como vítima de nada, quando também o foi.

O homem é quase visto como um sortudo com quem uma tenista (considerada das mais sensuais) se meteu. A mulher é vítima do exagero do atleta que é rotulado de mal educado e parvo. Mas na realidade os jornalistas não foram vítimas do mesmo? E os atletas não cometeram o mesmo erro?

6 comentários:

  1. O erro é o mesmo, é pouco profissional e não cai bem.
    Só que claro que há diferenças. Continuamos numa sociedade que não é igual, em que há muito mais violência, assédio sexual e violações contra mulheres. Então é normal que um avanço de uma mulher para um homem (mesmo que seja pouco profissional) seja levado com mais ligeireza. E assim vai ser até as coisas ficarem iguais, até a violência desmesurada contra mulheres acabe.

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    1. Como dizes o erro é o mesmo. Ambos estiveram mal. Mas as pessoas olham para as situações com diferentes olhares. Mesmo que o jornalista se queixasse ninguém o levaria a sério. As mulheres são vistas como mais frágeis quando são muito fortes.

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    2. Mas lá está, é normal que as pessoas vejam as situações como diferentes. Isto porque a sociedade é desigual na forma de tratamento das mulheres. Não é que as mulheres sejam mais frágeis, simplesmente são mais vítimas de abusos sexuais do que os homens.

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    3. Não nego isso. Pode ser que um dia tudo seja igual para ambos os sexos.

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  2. Realmente concordo contigo, sem dúvida que isso são situações muito idênticas mas tratadas de forma completamente diferente.

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