30.11.15

(mais um) dia triste para a comunicação social

Recordo-me do momento em que fui para a universidade. Os tempos eram diferentes daqueles que agora vivem os jovens estudantes. Mas já naquela altura se falava de desemprego e de mercados saturados. Tal como ainda deve acontecer com os jovens de hoje também fui alertado em relação à minha escolha. “Escolhe um curso com saída profissional” foi o conselho que algumas pessoas me transmitiram. Independentemente disso sempre fui para onde quis ir. Não escolhi o meu curso a pensar na eventual saída profissional. Prefiro fazer algo de que gosto do que estar insatisfeito numa área que até pode ter muita saída profissional no momento da matrícula mas que poderá estar completamente saturada no final do curso. Atrevo-me até a dizer que actualmente todas as áreas estão saturadas.

No momento da matrícula ponderei seguir a área de educação física. Infelizmente (ou felizmente) não fui a tempo de fazer provas físicas e ficar um ano sem estudar não era opção para mim. Acabei por seguir Comunicação Social pensando sobretudo na área do desporto. Se já gostava de jornalismo, com o curso passei a apreciar ainda mais a área onde me formei e onde tenho o “luxo” de trabalhar desde o momento em que terminei o curso. Recordo-me de no final do curso ter direito a um estágio no Cenjor. E foi lá que reparei num anúncio. A oferta dizia respeito a um estágio numa extinta publicação.

Candidatei-me sem grandes expectativas. Que ficaram reduzidas a zero quando soube que boa parte da minha turma se tinha candidatado. Alunos com melhores notas do que eu foram recusados pela publicação. Não escondo que fui desmotivado para a entrevista. Até porque me tinham dito que era péssima. Para meu espanto, após uns breves minutos de conversa o chefe de redacção (um dos meus “professores” neste mundo) perguntou-me se podia começar no dia seguinte. Aceitei e dei início a um cargo de merda (leia-se totalmente desinteressante) no dia seguinte. Apesar de ser um cargo com relevo na publicação mas sem interesse para quem o faz, fiz daquilo o emprego da minha vida. E semanas depois estava numa secção diferente.

Recordo-me da minha primeira entrevista, a um cantor brasileiro, que julgo ter ficado por publicar. Os tempos eram outros e para preparar a entrevista fui assistir a um concerto seu no antigo Pavilhão Atlântico. No dia seguinte foi a conversa e como recordação da primeira entrevista deu-me um álbum autografado, desejando boa sorte para a minha carreira. Nesta altura a minha remuneração era um almoço na cantina da empresa. Apenas isso. E assim seria ao longo de seis meses, algo que naquela altura da minha vida era aceitável. Mais uma vez fiz daquela oportunidade o emprego da minha vida. Até que a meio do estágio fui convidado a assinar contrato com a empresa. Onde ainda hoje estou.

Se recuar até aquele tempo deparo-me com dezenas de publicações. Nem consigo dizer o nome de todas. As redacções eram grandes. Os jornalistas tinham mais tempo para se entregar a um determinado tema. Já naquela altura não era fácil entrar numa redacção mas a oferta era muito maior do que hoje. Também existiam estagiários como existem hoje. Mas existiam igualmente oportunidades para os trabalhadores. E recordo-me de naquela altura as pessoas mais velhas me dizerem que já tinha sido bem melhor.

Cerca de dez anos depois o jornalismo é uma merda de uma sombra do que era. Ainda hoje fiquei a saber que os jornais Sol e i vão fechar. Vai nascer um novo projecto editorial com apenas um terço dos trabalhadores. E este é apenas mais um dia negro para a Comunicação Social pois ao longo dos últimos tempos as notícias em relação à área são sempre para falar de despedimentos e encerramento de publicações. Já perdi conta ao número de amigos e colegas que lutam para sobreviver nesta área ou que simplesmente seguem um caminho diferente, longe das notícias.

Nos dias que correm existem publicações feitas por um grande número de estagiários, que pouco ou nada recebem, e por apenas um jornalista mais batido na área que faz apenas os trabalhos importantes. Existem publicações (e até tenho vergonha de mencionar o nome de uma) que oferecem ordenados de 500 euros a recibos verdes. Existem poucas oportunidades de carreira, existem cada vez menos publicações e o jornalismo, pelo menos como o conhecemos, parece caminhar a passos largos para a sua morte ou extinção.

Continuo a achar que é uma área apaixonante. Gosto muito mais do jornalismo hoje do que no dia em que comecei a trabalhar nesta área. Continuo a acordar com paixão pelo que faço. Continuo a gostar de dar notícias. Mas é com tristeza que olho para o panorama actual da minha área. Acredito que pessoas que passem pelo blogue, que percam tempo a ler este texto e que sejam de outra área vão dizer que as suas áreas também estão assim. Não tenho dúvidas disso. Acaba por ser um reflexo da situação em que Portugal se encontra. E é pena que assim seja.

6 comentários:

  1. É uma triste verdade, mas não podemos baixar os braços. Sublinho o último parágrafo, não é só a área do jornalismo nessa situação.
    Acredito que os tempos vão melhorar (não nos resta mais nada do que acreditar).

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    1. Não podemos mesmo. E cada um tem de trilhar o seu caminho. Mas é triste quando olhas para o mercado profissional e não observas uma evolução.

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  2. Em 2010 também vi a minha área de trabalho ir pelo cano abaixo, chorei, mas levantei braços, recomecei na mesma área mas adaptando-me aos novos tempos e devagarinho, com muitos atropelos lá vou caminhando e este ano até me correu bem melhor, por isso nunca desistir, mas que é díficil é sim senhor em qualquer área.

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  3. Infelizmente é como dizes, hoje em dia estamos assim em todo o lado, em todas as áreas, ou pelo menos numa grande maioria, e é triste.

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