30.6.15

dá a cara

Existem campanhas de solidariedade que nos tocam mais do que outras. Não significa que tenham mais ou menos interesse ou relevância, simplesmente mexem connosco por algum motivo em especial. As que envolvem futebol são muito importantes para mim, porque comecei a jogar futebol federado aos 12 anos, joguei durante quase duas décadas e conheci todas as realidades que um jovem da minha idade podia conhecer. Joguei na primeira divisão, tendo como adversários clubes como o Benfica e o Sporting e jogadores que hoje são estrelas mundiais, joguei no Inatel, onde os árbitros aparecem bêbados nos jogos e joguei também em diversos campeonatos regionais e distritais. Participei também em estágios na Escola de Futebol Rui Águas e ainda na de Humberto Coelho, o que me permitiu experimentar a realidade profissional durante estágios de uma semana. Fui campeão, desci de divisão, tive prémios individuais, prémios colectivos, vivi bons momentos, outros menos bons e alguns muito maus. Isto, a nível de futebol de onze, em quatro clubes. 

Joguei no Paio Pires, no Amora, no Beira-Mar de Almada e mais recentemente no Azóia. E conheci diversas realidades. Equipei-me em balneários do tamanho de uma casa e noutros onde mal cabiam cinco pessoas, quanto mais quase vinte jogadores. Equipei-me em autocarros porque o balneário não tinha condições mínimas de higiene. Perdi conta ao número de vezes que tomei banho de água fria porque não havia quente. Demorei vinte minutos ou mais a tomar um duche porque a pressão da água era bastante reduzida. Esperei para tomar banho porque só funcionava um chuveiro. Joguei em campos onde o jogo parava para tirar as galinhas do campo. E noutros onde o árbitro tinha medo de expulsar do campo os meninos que brincavam durante o jogo e que moravam numa casa atrás da baliza. Joguei em campos onde as marcações eram feitas com produtos que queimavam. Joguei em campos que eram marcados como podiam e todos tortos fazendo com que fosse grande penalidade numa ponta da área e na outra estivesse fora da mesma quando deveria estar dentro. Fechei fechado em balneários à espera da Polícia para nos escoltar para o autocarro. Fui ameaçado. E podia ficar horas a relembrar coisas que ainda passavam pela falta de equipamentos, bolas e por aí fora. 

Isto para dizer que o futebol não é a imagem que aparece na televisão. Se mesmo na primeira divisão existem largos meses de ordenados em atraso, quanto mais em clubes pequenos cuja realidade é de meros tostões. Clubes que chegam a estar abertos quase por capricho e porque são a "salvação" de alguns meninos que passam belos momentos enquanto treinam e jogam. A Associação de Futebol de Lisboa (que reúne 24.642 atletas ligados ao futebol) criou a campanha Dá A Cara (#DáAcara) que pretende ajudar os clubes amadores e alertar para as necessidades dos clubes de bairro, aqueles que tão bem conheço na minha zona. 

Nos dias que correm nem todos os pais têm dinheiro suficiente para que o(s) filho(s) esteja inscrito nas escolas do Benfica, Sporting ou Porto. Muitos pais acabam por inscrever os filhos em clubes destes, que nada cobram mas que têm despesas com a inscrição dos atletas e que às vezes conseguem fazer negócios com os jovens jogadores. Recordo-me da altura em que o Amora me foi buscar ao Paio Pires, tendo o até então meu clube solicitado equipamentos e bolas para me libertar. Por exemplo, o que seria de Cristiano Ronaldo se não houvesse um clube modesto na Madeira onde deu nas vistas, atraindo o Nacional da Madeira e mais tarde o Sporting? E este é apenas um exemplo entre muitos pois a maioria dos craques começou assim. 

A Gillette associou-se a esta causa, doando 20 mil euros à Associação de Futebol de Lisboa. Nos vídeos da campanha podem ser vistos os jogadores Rúben Amorim, Pizzi e Bebé a falar sobre a realidades dos clubes amadores. Além disso, os jogadores dão a cara, fazendo a barba com uma Gillette. No final, desafiam cinco pessoas a seguir o seu exemplo. Podem saber mais sobre a campanha no site oficial, ficando a saber como podem partilhar os vossos vídeos. Partilho o vídeo de Rúben Amorim (podem ver os restantes clicando em cima dos nomes) e espero que este campanha seja um grande sucesso e que ajude, não só os clubes de Lisboa mas de todo o País que têm dificuldade em ter dinheiro para comprar uma bola de futebol em condições. 

#DáACara       

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