19.8.13

usa-me. abusa de mim. vezes sem conta

Ele. Rapaz na casa dos trinta anos. De bom coração, segundo os amigos. Um eterno apaixonado. Daqueles que acreditam no amor para a vida e que não concebem a entrega carnal despida de sentimentos. Ela. Mulher na mesma faixa etária. Divertida, alegre e adepta de noitadas com amigas. Apesar de gostar de sair à noite detesta sentir-se observada pelos homens. Algo que acontece com frequência. Tal como ele, só acredita em sexo com sentimento. Aliás, para ela não existem noites de sexo mas sim de amor. Ela não faz sexo. Ela faz amor. E critica quem faz o oposto do que defende.

Assim é ela. E assim é ele. Que nunca se viram. Que não se conhecem. Que não frequentam os mesmos locais. E que não têm amigos em comum. Até que, num dia, se cruzam no mesmo espaço. Num bar da moda numa qualquer cidade que vive a noite de forma ainda mais intensa do que o dia. É lá que se cruzam. E é lá que ele se rende a ela. À sua beleza. Imagem. E corpo escultural, segundo os parâmetros que ele mais aprecia numa mulher.

Ele congelou assim que os seus olhos vislumbraram a silhueta dela. Ficou preso. Até que ela se voltou para ele. “Linda”, pensou para si. “A mulher dos meus sonhos está aqui. Existe”, disse baixinho. Segundos depois, ele perdeu o controlo sobre si mesmo. E não deixou de olhar para ela. Sem ter a noção de que estava a ser tudo menos discreto. Até que ela se apercebe de que está a ser observada. Mas, ao contrário de tudo aquilo que criticava não se importou por estar a ser observada de forma intensa. Até gostou. E esboçou um sorriso na direcção dele.

Isto durou largos minutos. Até que ele sente que o único caminho é aproximar-se dela. Mesmo sem saber o que lhe irá dizer. Ele aproxima-se. Ela apercebe-se da movimentação dele. Ele está cada vez mais perto. E mais. Até que os corpos estão separados por meros centímetros. Juntos, ficam em silêncio durante alguns segundos. Ele porque não sabe o que dizer. Ela porque espera que ele tome a iniciativa.

Até que ele solta algumas palavras. “Usa-me. Leva-me daqui para fora. Abusa de mim. As vezes que quiseres e que te apetecer”, são as palavras que diz, apesar de nunca pensar ser capaz de as proferir. Ela não acredita no que ouve. O discurso não se coaduna com a sua maneira de ser. Porém, não lhe vira as costas. Nem o deixa a falar sozinho. Porque quer o mesmo do que ele. Pega-lhe na mão e arrasta-o para fora do bar onde estão. A noite prossegue e entregam-se os dois aquilo que ambos criticam. Mesmo sabendo que provavelmente não se vão voltar a ver depois daquela noite. Depois do tal sexo que não percebiam, ambos dão por si a pensar que o desejo tem razões que a própria razão desconhece. Por mais que se pense que tudo na vida é controlável.

25 comentários:

  1. Não é controlável mesmo. E aquilo que às vezes defendemos a pés juntos, às vezes, desmorona-se com a pessoa e no momento certo. Se tiver futuro... podemos mudar de opinião. Se não tiver, foi aberta a excepção. Um dia talvez voltemos a conseguir ser criticos e objectivos, mas a partir desse momento, olharemos sempre de modo diferente.

    Palavra de Roxanne! :)

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  2. hmmm.... deu para sentir a "carne" aqui.... Bem bom!

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  3. Roxanne de acordo contigo. e quanto mais queremos defender.. vem tudo atras.. :)

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  4. Não te conhecia esta veia e que veia ;)

    Bisou

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    1. É um texto no seguimento de outros do género que escrevi. É um tema de que gosto de falar :)

      beijos

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  5. Há momentos na vida em que tudo o que era deixa de ser e passa a não fazer sentido.

    Muito bom texto :)

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    1. E acontece sem que ninguém possa fazer nada contra isso :)

      Obrigado

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  6. nesta altura da minha vida, este texto encaixa perfeitamente em mim... =P

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  7. Nem sempre podemos cuspir para o ar e dizer "desta água não beberei", é um facto. Mas também há coisas (não necessariamente este tema: one night stands) em que cada um de nós poderá pôr as mãos no fogo por si.

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    1. É preciso ter muita força e um controlo muito grande Roger.

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  8. Excelente texto, para não variar:)
    Nesta área quem tiver a certeza absoluta de alguma coisa, está morto, porque enquanto estiver vivo e o desejo girar nas veias quente como o sangue...tudo pode acontecer e não há certezas de nada. Numa fração de segundos o que era deixa de ser.

    jinhossssss

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  9. Este comentário foi removido pelo autor.

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  10. Excelente texto...Fez-me pensar. Será que o que escreveste explica muitas traições? Daquelas pessoas que sempre disseram que eram incapazes de se deixarem levar por impulsos?

    E será que esses impulsos devem ser rejeitados? Será que ao rejeitarmos, a nossa decisão vau pesar-nos na consciência ou será varrida facilmente?

    Não é um tema nada linear...

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    1. É um tema complexo e que dava muito que falar. Sendo certo que é muito complicado travar os desejos. Sejam eles quais forem.

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